quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Rebelião

Ataranta-me a proliferação de senhas que os diversos sites com que interajo me obrigam a coleccionar. Não fora perigoso e criaria um herbário onde colocaria cada uma das senhas e a respectiva catalogação. Assim tenho de recorrer ao registo mnésico para poder entrar e sair de portas e portões onde a vida me faz entrar. Poderia ser como aqueles loucos benignos que possuem uma memória prodigiosa e que sabem de cor a lista telefónica de uma zona ou os resultados, jogo a jogo, do campeonato nacional de futebol desde que ele começou até aos dias de hoje. A loucura ainda não é a casa onde habito, mas nada me diz que não venha ser, por muito que me custe. Já a memória vai fenecendo dia após dia, num trabalho de rasura que começa pelas coisas mais recentes e, como uma onda, se vai propagando pelo passado. Enlouquecido e desmemoriado está o aquecimento desta casa. Para o tratar puseram-lhe um termóstato novo. Parecia ter serenado, trabalhava segundo a programação feita, não se esquecia dos parâmetros. Teve porém uma recidiva e trabalha furioso. Tenho de lhe pôr um colete-de-forças e mandá-lo internar, antes que morra de calor. Aborreço-me quando as coisas decidem ter autonomia e agem por conta própria, quando exibem uma contumácia de propósitos que contrariam as ordens que lhes prescrevo. Conheço pessoas que se pudessem ordenavam o mundo segundo os seus critérios e só assim ele, na sua opinião, seria perfeito e não o caos que é. Não me incluo nesse universo de ordenadores do mundo, mas também era evitável que meras maquinetas se rebelassem contra a minha vontade.

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