domingo, 4 de março de 2018

Leituras


A chuva sossegou, mas o dia continua preso à cinza com que as nuvens o cobrem. Não saio de casa e aproveito para ir adiantando algumas leituras entre mãos. Estas leituras, na verdade, não me servem para nada. Aquilo que preciso para o exercício da minha profissão é, por escandaloso que pareça, bem mais rudimentar. Muita gente faz o mesmo que eu, porventura melhor, sem ter sequer leituras. Alguém poderá supor que ler tem em si um valor intrínseco. Em tempos, depois de uma fase de crente, tornei-me agnóstico relativamente a esta proposição. Hoje sou ateu. Nenhuma leitura tem valor intrínseco. Pessoas com boas intenções dirão: ler ajuda a compreender o mundo. Também aqui a minha propensão, depois de passar os sessenta, é de transitar do agnosticismo para o ateísmo. Resta ler por prazer. Sim, é uma hipótese. Outra será ler porque não se sabe fazer outra coisa. Aliás nem constituem um dilema. A incompetência e o prazer andam de mãos dadas muitas vezes. Aqui e ali, a muralha de nuvens abre pequenas brechas por onde escorre uma luz viva e se avistam farrapos azuis do céu. O tempo passa, o melhor será mesmo pegar no livro.