segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Ciclos de festividades

Estamos no tempo do Advento. É um tempo essencial da liturgia católica, mas que já ninguém, isto é uma hipérbole, foi-me sublinhado, faz a mínima ideia do que seja. Uma cultura pode secularizar-se, pode até tornar-se descrente e viver de costas voltadas para o núcleo de crenças que a formou, mas se perde aquilo que um dia lhe ritmou a vida, os ciclos de festividades entretecidos na vida quotidiana, então está muito doente. Vive para a escravatura. Tudo isto disse-me, na conversa de ontem, o padre Lodo. Só pensei nisso hoje, agora que a hora de almoço já passou e tenho de enfrentar uma tarde em que a realidade reivindica as suas prerrogativas, isto é, a minha participação na escravatura. Também eu perdi o ritmo que deveria pautar a minha existência. Hoje, por exemplo, passei a manhã em visitas a lojas para encher a vida de coisas cuja utilidade nos foi assinalada por um génio maligno, um diabrete ocioso e perdulário, que, sem parar, cogita a maneira de nos perder. Seja como for, muito eu gosto destas expressões que não dizem nada, o Natal com os seus presépios, árvores e restante parafernália já está montado cá por casa. Temo, porém, que sirva para pouco, caso as crianças não ponham cá os pés, confinadas na capital. O bosque da escola ao lado está exuberante nos verdes e cinzas que o compõem, enquanto um sol desmaiado semeia vestígios de luz nas paredes dos prédios. Pombos voam entre telhados e eu penso no pouco sentido de tudo o que existe, mas é apenas um pensamento provocado pela dificuldade de digestão do almoço. Talvez pudesse ter sido mais frugal, ocorre-me.

2 comentários:

  1. Há 85 anos, ao morrer, no Hospital de São Luís dos Franceses, um homem extraordinário escreveu esta frase:
    «I know not what tomorrow will bring.»
    E cá estamos nós, ainda sem termos conseguido descobrir o que e como será o dia a seguir...
    Resta-nos viver um dia de cada vez, e esperarmos que tudo corra pelo melhor.

    Bom Advento, HV.
    🎄
    Maria

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    1. Faz hoje precisamente 85 anos que ele morreu.

      A frase, porém, aplica-se a qualquer circunstância. Nunca sabemos o que o amanhã nos trará.

      Bom Advento, Maria

      HV

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