sexta-feira, 7 de junho de 2024

Arruadas

As sextas-feiras chegam depressa, mas os sábados e domingos dissolvem-se enquanto o diabo esfrega um olho, se for o caso de o tinhoso ser dotado de olhos. Estamos em maré eleitoral, assunto político que me está vedado, mas é sobre ele que insisto em escrever hoje, nesta sexta-feira que antecede o dia em que o corpo eleitoral, com e sem olhos, reflectirá sobre qual partido recairá a sua preferência, treinando em casa o preenchimento do boletim de voto, não vá o X transbordar os limites do quadrado preferido e contaminar outros quadrados, tornando-se assim em X nulo. Há que obstar à nulidade. O que me impressiona nas campanhas eleitorais é a prática generalizada de arruadas. Impressiona, logo, porque o termo se aproxima perigosamente de arruaças. É uma letra que separa um desfile partidário de um tumulto. Por aquilo que venho observando há anos, as arruadas são coisas pacíficas, onde uns figurantes andam com bandeiras e outros são obrigados a dar beijos e a tirar selfies, o que não é fácil, reconheça-se. Em Portugal, a distinção entre direita e esquerda cessa quando se chega à vexata quaestio da arruada. Todos gostam de arruar, embora o que se deva dizer é que gostam de arrulhar, como se os candidatos a nossos representantes fossem da família dos columbídeos, uns pombinhos e umas rolinhas. Temos assim, na arruada, o momento central da campanha eleitora. Um bando de columbídeos arruam com bandeiras ao vento. Ao verem potenciais eleitores começam a arrulhar e, caso se cruzem com outro bando de columbídeos que também arrulham, corre-se o risco de arruaçarem, mas logo lhes volta o espírito de pombo ou de rola, e toca de arrulhar, não vá algum eleitor estar à espreita. Por certo, com tantos arrulhos na rua, haverá casamentos e, se não os houver, sempre aparecerá uma ou outra gravidez indesejada, o que contribuirá para suster a queda demográfica. Este é o verdadeiro significado de uma arruada.

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