sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

A escada rolante

A semana fechou-se no escuro da noite, deslizou sorrateira para os braços do esquecimento, para o porto onde os homens, depauperados pela inutilidade dos dias, aguardam o festim do sábado, o grande baile em que dançam, dançam, dançam na sala vazia da solidão. As noites de sexta-feira são promessas que o tempo nunca cumprirá. Sento-me, cerro os olhos e deixo o pensamento vaguear. O ideal seria não pensar, parar a corrente de consciência e entrar na escuridão de mim mesmo, escutar o inaudível que uiva no âmago do corpo, aproximar-me desse silêncio que as vezes ecoa numa imagem, num gesto, na pétala de uma rosa que o vento arrasta. Na aparelhagem, um quator solta-se, inunda o ar e cai sobre mim. Também nele o silêncio ladra, penso e levanto-me. Vou jantar e logo sou arrastado pela escada rolante do tempo.