quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Meditações linguísticas

Acabei de dar uma vista de olhos pela imprensa online e vislumbrei – pobre de mim, simples narrador sujeito à vontade do autor – o motivo que leva a que conversas sobre política estejam aqui rigorosamente proibidas. Imagino que na cabeça do autor exista uma férrea censura a uma linguagem que se degradou. Os gregos antigos pensavam que os grandes homens, e os políticos seriam grandes homens, teriam também grandes palavras. A grandeza vinha das acções e do discurso. Ora, o discurso político, nos dias que correm, reduziu-se à berraria inflamada para explorar emoções primárias ou a uma linguagem estereotipada cuja finalidade é dizer o menos possível, pois pouco se tem para dizer. O discurso político é uma linguagem em quarto minguante, à beira de chegar à lua nova. Este empobrecimento linguístico é também um modo de empobrecimento da realidade em que se age. A oclusão do horizonte da pólis é fruto de uma linguagem que se degradou. Uma das teses do autor, sobre a qual eu, narrador, tenho dúvidas, se não mesmo completa discordância, é que a degradação do discurso nasce da ideia tonta, para usar a sua classificação, de que a linguagem é, antes de mais, um veículo de comunicação. Se assim é, então quanto mais simplória for a linguagem mais facilmente estabelece comunicação. A linguagem, todavia, só acessoriamente tem uma função de comunicação. Ela é uma forma de trazer à luz aquilo que é. Na linguagem, as coisas mostram-se na sua especificidade e diferença. Aquele que fala é um mediador e um revelador da realidade na sua profunda complexidade. A linguagem mostra o incomum. Quando se reduz à comunicação fica presa ao comum, isto é, à trivialidade. O discurso político reduziu-se à trivialidade comunicacional. Tornou-se impotente para manifestar aquilo que na vida da pólis é incomum. Isto, porém, são pensamentos do autor, que o narrador não partilha. Depois desta arenga sem sentido nem necessidade, podemos escutar, a primeira estrofe de um poema de Maria da Saudade Cortesão: Oh Posêidone / deus de cabelo dissoluto e azul / a cadência das marés surge / de teus braços fluidos, oh Taureus. / Pelo sacrílego perjúrio de Minos / a tua vingança cai, como é uso dos deuses, / sobre uma vítima alheia àquela culpa.

Sem comentários:

Enviar um comentário