Agora que estamos em pleno Advento e que o Natal se aproxima, a que coisa responde esse acontecimento do nascimento de um Menino no presépio de Belém? Faz-se esta pergunta porque todos os acontecimentos podem ser encarados como respostas a perguntas, embora não tenhamos clara consciência do facto. Os cinco primeiros versos do poema Paraíso Perdido, de John Milton, dão-nos uma resposta: Da rebelia adâmica, e o fruto / Da árvore- interdita, e mortal prova / Que ao mundo trouxe morte e toda a dor, / Com perda do Éden, ‘té que homem maior / Nos restaure, e o lugar feliz nos ganhe. O que está em jogo é a restauração daquilo que os homens eram antes da rebelião adâmica e da prova do fruto da árvore proibida. O Natal é o nascimento do Adão restaurador, mas a restauração só se dará pela sua morte, pois foi através de Adão que a morte veio ao mundo. O acontecimento de Belém é apenas o início do fechamento de um ciclo, o qual só estará concluído na ressurreição desse Adão que expirou no Gólgota. Da vida plena à morte e à vida degradada, e desta, de novo, à morte e à vida plena. Não admira que Tertuliano tenha afirmado Credo quia ineptum est, isto é, Creio porque é absurdo. A interpretação da frase terá arrastado longas controvérsias, como é habitual no mundo humano das ideias, mas ela sublinha que se está perante uma implausibilidade, tendo em conta a ordem conhecida da natureza. É irrelevante a interpretação que se faça do dito de Tertuliano, como é irrelevante sublinhar-se uma eventual oposição entre o absurdo e o plausível ou razoável. Toda a razoabilidade humana, toda a racionalidade, se funda numa dimensão não razoável e não racional, numa dimensão absurda. A razão é aquela faculdade que os homens receberam – ou desenvolveram – para encontrar um sentido naquilo que, por natureza, é destituído dele, mas que tem uma força propulsora da vida. Daí as inúmeras interpretações desse estranho ciclo que liga o Éden e a árvore do conhecimento, o nascimento em Belém, a morte no Gólgota e a ressurreição ao terceiro dia. Este ciclo manter-se-á vivo enquanto a sua estranheza e o que tem de absurdo para a nossa razão assim se mantiver, estranho e absurdo.
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