domingo, 13 de agosto de 2023

O amor à conspiração

Imagino que todos nós amemos conspirações. Há aqueles que fazem desse amor uma razão de vida. Em tudo vêem conspirações e por detrás destas descobrem agentes obscuros, embora possam ser nomeados, que conjugam uma inteligência diabólica e uma vontade malévola. Não vale a pena dar exemplos. Contudo estes amantes das teorias da conspiração são péssimos na arte de as amar. Um autêntico amante de conspirações, um daqueles que não apenas leu, nas versões aplicadas ao amor do conspirativo, a Arte de Amar, de Ovídio, mas também a Metafísica do Sexo, de Julius Evola, sabe que tudo é conspiração e que essa omni-conspiração se funda na conspiração das conspirações, a conspiração essencial. O modo de vida que agora se leva resulta de uma conspiração contra o modo de vida que se levava na infância. Toda a conspiração – para os amantes autênticos e letrados de conspirações – está assente no objectivo de nos destruir a infância. É evidente que nunca ninguém teve uma infância, pois quando estamos nela não temos consciência de que aquilo é a infância, e quando saímos dela já a perdemos. Então, o organismo, guiado pelo cérebro, põe-se a inventar a infância e, ao mesmo tempo, descobre a terrível conspiração contra essa infância fantasiada, conspiração que visa matar-nos a boa vida e os bons tempos em que éramos infantes. Se se reparar com atenção, todas as teorias da conspiração – tratem elas da terrível conspiração que nos quer fazer crer que os homens foram à Lua ou pretendam alcançar a dominação mundial através da disseminação da ideia de que Terra é redonda ou que houve uma pandemia do COVID-19 – são reconfigurações dessa conspiração contra a infância que cada um inventa. Por isso, estamos constantemente a dizer que eles estão a fazer isto e aquilo. O isto e aquilo não interessa o que seja, o que interessa mesmo é que o eles se refere a esses conspiradores que estão em toda a parte e cuidam não de nós, mas da destruição da nossa infância, isto é, de uma coisa que nunca tivemos.

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