Leio um poema de Rainer Maria Rilke. Corrijo, leio uma tradução de um poema de Rainer Maria Rilke. Desconfio de algumas palavras usadas pela tradutora. Procuro o original e encontro-o online. O alemão é-me incompreensível, mas recorro a traduções automáticas e confirmo que há palavras acrescentadas. Servem para compor a rima e, o pior de tudo, dar uma pretensa tonalidade poética à linguagem da tradução. É esta tentativa de simular uma poeticidade que constitui o núcleo central da traição que existe em toda a tradução de poesia. Poder-se-á pensar que só poetas deveriam traduzir poetas, mas mesmo isso é incapaz de assegurar a transposição de um poema de uma língua para outra. Um poema é um acontecimento irrepetível, um caso em que um certo som se combina com um certo sentido. Enquanto num texto em prosa é possível que a sonoridade não seja essencial, num poema ela é uma condição necessária. Ler um poema só é possível na língua original. Quando se lê uma tradução – e faço-o com frequência, pois são poucas as línguas em que posso ler o original – já se lê outra coisa, eventualmente, um poema, mas já não o mesmo, mas um sucedâneo ou, melhor, um simulacro do original.
O tradutor
ResponderEliminarNão é um fingidor
Não é, de todo. Traduttore, traditore.
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