sexta-feira, 8 de junho de 2018

Precariedade


É tudo tão precário, penso ao saber da morte de alguém que conhecia. Tento prender o tempo com as mãos, mas ele escorre-me entre os dedos. Um súbito raio de sol ilumina o casario, há paredes a cintilar, mas as brechas já fazem o seu caminho, marcham hirtas segundo o calendário da ruína. Se passo no centro antigo da cidade, o desconsolo inunda-me o olhar. Logo a razão me aquieta. Também as cidades estão sob o império do tempo. O coração protesta, mas a tirania que rege a vida é mais inflexível do que aquilo que supomos. Uma nuvem interpôs-se entre o sol e os meus olhos. Onde havia cintilação há agora uma cinza suave, secreta, precária. Oiço vozes e elas são já um passado que não retornará, presas na ruína dos seus próprios sons, destroços de um desejo que o tempo calará.