Hoje comecei o dia com uma caminhada de seis quilómetros. Não havia sol nem vento e, por onde passei, poucos eram os que por lá andavam. Os sábados convidam as pessoas a manhãs recatadas, foi o que pensei. Depois, o dia expandiu-se, passou a fronteira do meio-dia e deixou-se cair na armadilha da tarde. As notícias, porém, não distinguem os dias úteis e os inúteis, o vírus também não, embora tenha um talento especial para a metamorfose e um gosto acentuado pela alteridade. Deveria evitar, dizem-me, projectar na fonte do nosso pesar características humanas, mas se tudo o que nos acontece e nos envolve é sentido e compreendido por faculdades humanas, não há outro remédio que não seja contaminar tudo isso, vírus incluídos, com as nossas projecções. Basta olhar para uma paisagem para que ela se humanize. Isto não significa que se torne melhor ou pior, mas que toma as características de quem para ela olha. Se isto não é verdade, poderia ou deveria sê-lo. Há sábados em que é muito difícil encontrar motivos para escrever. Cumpro ordens, apenas, e isso é tudo o que eu, pobre narrador, posso dizer em minha defesa. Talvez devesse ter sido mais frugal ao almoço, talvez.
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