Talvez seja uma ilusão de óptica, mas os loendros da escola aqui ao lado já floriram. Arbustos verdejantes deixam-se trespassar por pequenas mancha cor-de-rosa. Sob o sol, brilham e, tocados pelo zéfiro, dançam ondulantes perante o meu olhar. A vida vegetal não é menos enigmática que a animal. É menos dada a fogos-de-artifício, a grandes explosões de ira, aos jogos onde a vida e a morte se entregam a núpcias que parecem eternas. Se mata, é por descuido da natureza ou da vítima. O domingo corre para a hora de almoço. Vai chegar quase aos 30 graus, para anunciar a praga do Verão. Irei, como é habitual aos domingos, almoçar tarde. Uma conversa havida sobre arte chegou ao grau de perplexidade que é habitual neste tipo de conversas. A dificuldade de oferecer uma definição consensual do fenómeno. A conversa acaba sempre por resvalar para um certo tipo de cepticismo, cujo pano de fundo é a impossibilidade de definir o que é uma obra de arte. Talvez Johann Scheffler, para desgosto de filósofos que fazem profissão da arte do argumento, possa ajudar. Uma ajuda inadvertida, como todas as boas ajudas. Viveu no século XVII e ficou conhecido por Angelus Silesius. Um pequeno poema diz-nos a rosa é sem porquê; floresce porque floresce / não cuida de si mesma; não pergunta se alguém a vê. Talvez a arte seja essa rosa sem razão e a procura de razões daquilo que a não tem seja uma doença. Uma doença, perguntará o eventual leitor. Uma doença ocular, direi, talvez não seja cegueira profunda, mas uma forma de enviesar os olhos. Imagino que os que procuram definir arte ou rosas ou seja o que for sejam vesgos. Isto, porém, são imaginações e fantasias de um domingo em que se almoça tarde.
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