Há pouco lembrei-me de um título de um filme dos irmãos Cohen, que também é título de um dos romances de Cormac McCarthy, Este País Não É para Velhos. Isto a propósito de uma insidiosa forma de exclusão que os livreiros decidiram pôr em marcha, para afastarem da sua clientela pessoas cuja idade já não permite ler com conforto, apesar dos óculos, letras minúsculas com que decidem imprimir os livros, que esperam vender. Por motivos que não vêm ao caso, decidi abrir o livro Palácio de Cristal, de Peter Sloterdijk. Quando me predispunha a ler umas páginas, sinto-me expulso da leitura e quase ouvi o editor murmurar este livro não é para velhos. Se me fosse permitida a política, haveria de organizar um movimento para regular o tamanho das letras que formam palavras com que são construídos os livros. O regulador assegurar-se-ia de que nenhum livro seria impresso sem que as letras tivessem um certo tamanho, pois aqui o tamanho conta. Para evitar exclusões, entenda-se. Esta, porém, não foi a minha grande aventura de hoje. Ao chegar à porta do prédio onde vivo, digito o código de entrada e nada. Olhei para o dispositivo com olhar de quem pede esmola, mas ele manteve-se impávido e comprometido com a sua decisão de não cooperar com os moradores. Vou ao molho de chaves que arrasto comigo e, depois de algumas experiências, descobri que não tinha chave da porta de entrada. Como um cão abandonado, fiquei à porta aguardando que alguém saísse do prédio para eu entrar. Agora, tenho outra aventura. Onde estará a chave que eu deveria ter? O melhor é ligar para o condomínio e pedir que me façam outra. Isto, se não me esquecer. Como se vê, o mundo existe apenas para desfazer os nossos planos, para se rir dos nossos possíveis mais próprios. Esta última frase, além de ridícula, era dispensável, mas ninguém pode deixar de ser quem é.
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