O que sabemos nós daquilo que move os outros? Foi esta questão que me ocorreu ao ler o que um crítico da revista Illustração, no ano de 1884, escreveu acerca do escritor portuense Alberto Pimentel: O sr. Alberto Pimentel quer ser tudo (…) d'aqui resulta, que querendo ser tudo — o sr. Pimentel não é por emquanto cousa alguma nas lusitanas lettras! E acrescenta na sua verrina crítica: por querer ser tudo, por querer escrever sobre tudo. Quanto melhor não fora que o sr. Alberto Pimentel pensasse apenas em ser poeta, ou em ser jornalista, ou em ser regenerador. Havia de valer alguma cousa, pois que nós não duvidamos um momento do apregoado talento do sr. Pimentel. Mas com a mania de querer ser tudo, de querer fallar e escrever sobre tudo, ha-de cada dia ver mais distante da sua porta a Posterioridade. O crítico da Illustração acertou. Hoje, poucos sabem quem foi Alberto Pimentel e ainda menos são os que o lêem, caso haja alguém. Contudo, quem confiou ao crítico os segredos da alma do escritor? Quem lhe disse que aquilo que o motivava era ser alguma coisa nas letras lusitanas ou acamaradar com a Posteridade? É verdade que Alberto Pimentel escreveu sobre muitas coisas e abraçou inúmeros géneros literários, mas isso pode ser apenas a prova de que o prazer do escritor era o de escrever, o de sentir a pena a ranger sobre o papel, de ver os textos crescerem e tomar forma para que outros os lessem, e havia muitos que no tempo os liam. Este tipo de crítica literária estava todo ele assente numa conhecida falácia, o argumentum ad hominem, o ataque pessoal. Seria pertinente pegar num romance e mostrar as suas inconsistências, mas discorrer publicamente sobre o tipo de vida que alguém decide levar, sem com ele molestar os direitos de terceiros, é uma patologia fundada na crença implausível de que se sabe aquilo que os outros querem da vida.
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