O corpo que também somos é uma coisa extraordinária até ao momento em que damos pela sua existência. Damos por ele não quando o vemos ao espelho, pois aí damos apenas pela existência de um reflexo, mas quando alguma coisa desse corpo se torna incómoda. Foi o que me aconteceu hoje com um dente. Depois de uma viagem à capital de distrito, comecei a notar que tinha um molar no lado esquerdo do maxilar inferior. A descoberta não foi motivo de júbilo. Então, perante o meu desagrado, ele começou a ameaçar com uma dor. Pouco depois do almoço, estava sentado na cadeira da dentista para avaliar a situação. A sentença foi a que eu esperava. Este molar já me tinha chamada várias vezes a atenção. Foi de tratamento em tratamento até que hoje recebeu o veredicto: ablação. Antibiótico mais ibuprofeno e quarta-feira será o dia da execução e o início dos trabalhos da substituição. Isto demonstra a minha tese acerca da natureza extraordinária do corpo. Quanto menos se dá por ele, mais extraordinário é. A grande vantagem dos anjos sobre os homens é não terem corpo, para além de não terem sexo. Nunca correm o risco de se deparar com ele num voo malsucedido. Alguém já ouviu falar de um anjo que fosse ao dentista? Ninguém.
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