terça-feira, 13 de junho de 2023

Do mal

Hoje, floriu a última orquídea. Foi a tempo de apanhar todas as outras floridas. Mais uns dias e haveria já uma ou outra que se teria despedido do seu fulgor. Olhando para todas, não encontro razões para tal disparidade na gestão do tempo, mas os meus olhos são pouco indicados para encontrar tais razões, pois a ignorância sobre o assunto é tão grande que mesmo aquilo que vejo é como se não visse. Passei parte da manhã a ouvir alguém em confissão. Logo eu que não tenho qualquer vocação sacerdotal. Bem, não se tratava de uma confissão, mas de um desabafo sobre pecados alheios. A confessada, pois era alguém do sexo feminino, era mais paciente do que agente, sofria mais os pecados de outrem do que se referia aos seus. O interessante é que a pecadora, pois também o agente era do sexo feminino, não vê o pecado como pecado, mas, aposto, acha as suas acções virtuosas. Não se reconhecerá, por certo, como maldosa. Caso fosse religiosa, julgo que se acharia merecedora da glória dos altares. Apesar do discurso quase teológico, a coisa nada tem que ver com a religião, mas com a trivialidade das coisas quotidianas. Enquanto ouvia o desabafo, ia pensando que há pessoas, de tão mal resolvidas que estão na existência, que parecem ter nascido para azucrinar a cabeça a terceiros. Imagino que sintam nisso uma compensação pelo o facto de serem irresolvidas. Fossem essas pessoas orquídeas, e a pecadora poderia ter sido uma bela orquídea, e nunca haveriam de florir. Como se vê, nem tudo o que é possível se torna real. Nem tudo o que está em potência passa ao acto, para citar o velho estagirita.

3 comentários:

  1. Graças a Deus, as flores são analfabetas e, parece que também, surdas.

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    1. Talvez sejam só mudas. Ouvem e sabem ler, mas não dizem nada.

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    2. Averia de haver um hexistir,

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