Sentado ao balcão, o homem metia conversa com as mulheres
que passavam. Elas, bastante mais novas, condescendiam em trocar umas palavras.
É penoso envelhecer, pensei, enquanto ia almoçando apressado num canto do bar.
A tarde entrava pela grande vidraça e caía ensolarada e impiedosa sobre as mesas.
A Primavera aproxima-se, até um corpo gasto ainda sente o sobressalto, concluí.
A boca do homem enrolava-se à procura de uma palavra, uma única que pudesse dizer
a memória fugaz do desejo, daquele desejo que se desejaria ter. Quase senti
vergonha de estar ali e de assistir à luta desigual do corpo gasto contra o
tempo. Elas sorriam perante a banalidade, respondiam com outra e seguiam em
direcção à porta, sem que ele esboçasse um protesto. Eram as regras do jogo,
deduzi. A rua esperava-as e, na sua complacência, pressenti o medo que as
habita, esse medo de chegar a hora em que faltam palavras para o desejo, em que
este para se dizer gagueja e descobre as piores, aquelas em que nunca deve ser
dito. É penoso envelhecer nestes dias de sol, em que a Primavera se anuncia e o
deus anda solto e desamparado pelos campos.