Temos uma certa crença fundada em experiências antigas – por
exemplo, o caminho que liga duas povoações e que foi percorrido inúmeras vezes
nos anos setenta do século passado – e estamos certos dessa crença. A certa
altura passa-se, dizemos ufanos a quem nos acompanha, por aqui e por ali. Depois,
descobre-se que não se passa nem por aqui nem por ali e ficamos perplexos sem
saber se já não se passa ou se nunca se passou. A memória é um poder estranho e
pouco confiável. Quando pensamos que ela reproduz uma realidade vivida, ela
logo nos mostra que a sua função é inventar vidas que nunca existiram, caminhos
que nunca foram percorridos ou acontecimentos que nunca aconteceram. Ou talvez
tudo isto seja uma história dominical, onde os caminhos do fim-de-semana não
coincidem, por respeito ao ócio, com os dos dias úteis, subjugados que estão à
corveia que a existência nos impõe.