sexta-feira, 24 de outubro de 2025

Emmanuel e Immanuel

Terá nascido em 1688 e morrido em 1772 e foi, durante parte substancial da sua vida adulta, um respeitável cientista. Emmanuel Swedenborg, um sueco, interessou-se por matemática, geologia, anatomia, fisiologia, astronomia. Esta amplitude de interesses não era rara naqueles dias. Por volta dos 56 anos, porém, teve uma série de sonhos, visões, experiências místicas. Estas aventuras culminaram com uma visão de Jesus Cristo, que, segundo Swedenborg, o terá instruído a escrever sobre assuntos espirituais. A partir de então, substituiu as múltiplas ciências pela sua muito particular teologia. Argumentou que se lhe tinham aberto os sentidos espirituais, o que lhe permitia comunicar com anjos, espíritos e visitar o mundo espiritual. A sua teoria mais conhecida é a doutrina das correspondências. Defende que o mundo físico é um reflexo do mundo espiritual, cada objecto material corresponde a uma verdade espiritual, o que não difere muito do platonismo. Um outro Emanuel – precisamente, Immanuel – agora alemão, e de apelido Kant, chegou a interessar-se pelo homónimo sueco. Contudo ao ler a obra principal, Arcana Coelestia ficou em estado de choque. Em 1766, escreveu Träume eines Geistersehers, erläutert durch Träume der Metaphysik, o que significa em português: Sonhos de um Vidente, Esclarecidos por Sonhos da Metafísica. Kant nunca achou que Swedenborg fosse um charlatão, mas uma mente sonhadora fruto de uma doença mental ou de uma imaginação sem controlo. O problema das crenças do sueco residia, segundo o alemão, em que o primeiro ultrapassava os inflexíveis limites da experiência possível. Talvez seja neste momento que Kant descobre o caminho para se tornar o Kant que conhecemos. Não acreditava em sentidos espirituais, mas apenas naqueles que nos dão informação sobre o mundo, os prosaico cinco sentidos. O conhecimento do mundo espiritual, segundo o filósofo alemão, está-nos interdito. A metafísica, enquanto ciência, é uma impossibilidade. Ora, até aos 56 anos, Swedenborg não parece ter tido grande interesse por esse mundo metafísicos. O enigma, porém, não reside no sueco, mas no alemão. O que seria Kant se, aos 56 anos, tivesse o conjunto de experiências que teve Swedenborg? Tornar-se-ia um vidente sonhador ou procuraria um médico para se tratar?

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