quarta-feira, 15 de outubro de 2025

Pensamento

Há pouco passei os olhos pelos títulos de uma revista a sair em breve. Um deles reteve-me: Recuperar a hegemonia do pensamento progressista. Há aqui um equívoco doloroso. O uso da palavra pensamento. Onde há pensamento autêntico não há progressismo nem regressismo, não há revolução nem reacção. Muito menos um desejo de hegemonia. Tudo isto faz parte do não pensamento a que se dá, não sem correcção, o nome de ideologia. Pensar é abrir-se ao inesperado e comprometer-se com a verdade, seja do que for. Ora, a ideologia – qualquer que seja – usa os mecanismos do pensamento, as estruturas lógicas e as técnicas retóricas não para descobrir o que ainda não foi pensado e a verdade que aí reside, mas para impor um conjunto de simplificações sobre a ordem social e moral. Se há uma coisa incapaz de hegemonia é o pensamento, a acção mais frágil que um homem pode empreender em busca da verdade, a flor mais rara presente no jardim botânico da mente humana. Onde há hegemonia, ou busca de hegemonia, o que está em jogo não é pensar, mas alcançar ou manter o poder sobre os outros. Há palavras cujo uso deveria ser muito parco. Pensamento é uma delas, pois são raras as vezes que um ser humano, de facto, pensa.

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