Acabei de chegar de Itália. Ouvi do outro lado do telemóvel. Foi ao enterro do Papa, respondi. Uma gargalhada. Não, não. Devia ter ido, afinal ambos foram formados pela mesma Sociedade, respondi. Ou a sua veia de Settembrini, apesar de ser um jesuíta, o torna jacobino, acrescentei. O meu amigo padre Lodo, Lodovico Settembrini, continuou a rir. Não me provoque, ameaçou. Fui ver um sobrinho bisneto e baptizá-lo. Il Piccolo Settembrini que há-de assegurar a continuidade imortal dos Settembrinis, atirei. Sempre me pareceu que crê mais na imortalidade grega – aquela que vem pelos grandes actos e grandes palavras, mas, acima de tudo, pela continuidade biológica – do que naquela que lhe chegou de Jerusalém. Hoje, não consegue provocar-me. Além do mais, não acredito nessa veia de provocador, respondeu-me. Bem me parecia que lhe falhava a fé, contrapus. Sim, por vezes falta-me a fé, não no Alto, mas nas coisas baixas. Há muito tempo que não conversávamos, declarei, para mudar de assunto. Apesar da idade, tenho andado muito ocupado e não apenas com o baptizado do Pietro. Assuntos da Companhia. Não somos assim tantos e as solicitações não param. Liguei-lhe para combinarmos um jantar no próximo sábado. Estará cá o Hans e a Emília; acho que devemos juntar o grupo todo. Isso não será uma desculpa para esconder o pecado da gula? Não se preocupe com os meus pecados, ouvi. Trato disso, ao contrário de si, exclamou. Por mim, disse, nada a opor; antes pelo contrário. Quer que eu escolha o sítio e marque, perguntei. Não se preocupe, eu trato disso, prometo. Desde que não seja... não tive tempo de acabar a frase. Eu sei, eu sei. Estamos combinados, continuou, depois digo-lhe o local e a hora é a de sempre. Agora, tenho de ligar para a família em Itália.
domingo, 27 de abril de 2025
sábado, 26 de abril de 2025
Dignos de registo
Não sei por que razão chegou à minha consciência a expressão A Ronda da Noite. É a designação de um programa da Antena 2, onde se fala de livros. É também um eco de um quadro de Rembrandt. O título é fascinante. Aliás, sinto um grande fascínio por títulos. Um dos filósofos com mais talento para os produzir é o italiano Giorgio Agamben. Recebi há pouco — também há empresas a fazer entregas ao sábado — uma série de livros, entre eles a edição integral, num único volume, de Homo Sacer, a qual contém em si nove obras distintas. Veja-se o título da primeira obra: Homo Sacer – O poder soberano e a vida nua. O quarto livro da série é Horkos. O sacramento da linguagem – Arqueologia do juramento. O quinto também tem um título notável: Oikonomia. O Reino e a Glória – Para uma genealogia teológica da economia e do governo. Também se distinguem Opus Dei. Arqueologia do Ofício e, ainda dentro da série Homo Sacer, O uso dos corpos. Fora da série, O Tempo que resta – Comentário à Carta aos Romanos e O Reino e o Jardim não ficam atrás. Encontrar títulos é um exercício requintado, pois envolve, por um lado, uma grande capacidade de síntese e, por outro, um afinado sentido estético. Imagino que Agamben terá um grande prazer em baptizar as suas obras, talvez tanto quanto em escrevê-las. Entre os livros que recebi hoje, vinha também um de outro filósofo italiano, Paolo Virno. Também ele sabe encontrar excelentes títulos: Gramática da Multidão – Para uma análise das formas de vida contemporâneas. Agora que escrevo sobre isto, ocorre-me que o facto de ambos serem italianos pode ter uma importância decisiva. Talvez a arte de escolher bons títulos seja um fenómeno regional. Não digo todo o mundo, mas todo o Ocidente devia ser italiano. Não por motivos políticos ou sociais — isso seria uma péssima ideia —, mas por uma questão estética. Nem que fosse para aprender a encontrar títulos dignos de registo.
sexta-feira, 25 de abril de 2025
Uma arte
Um dos meus talentos – talvez o único – é o da arte de protelar. Protelei tanto que fui coagido pela realidade a dedicar o feriado a coisas que tinha de fazer, mas cuja execução me causa náuseas. E, esclareça-se, não sou dado a náuseas, embora a náusea sartriana tenha exercido fascínio sobre a minha configuração mental mais do que devia, reconheço. Não sofro de procrastinação. O meu adiar coisas repelentes não é uma doença, mas uma arte, a arte de protelar, como escrevi acima. Procrastinar é uma doença porque o sujeito que procrastina é passivo. Sofre a procrastinação, como se sofresse de reumático, de gripe ou de uma qualquer doença do catálogo sem fim que os médicos guardam no cofre-forte dos seus consultórios. Protelar, porém, resulta de uma decisão, a qual dá às coisas proteladas espaço para amadurecerem, para se tornarem mais sólidas e, por isso, mais imperativas. Quando chegam a essa fase, apresentam-se diante de mim – daquele que as permitiu desenvolver na irresolução – e, peremptórias, pedem para serem resolvidas. Eu cedo ao pedido. Por isso, quase não dei pelo feriado cívico, ocupado com aquilo que tinha adiado. Este episódio é virtuoso. Mostra que a ordem do mundo está errada, coisa que Hamlet já sabia ou o próprio Quixote. Errada porquê? Pelo facto de tudo aquilo que eu protelo não desaparecer no seu protelamento. Isso, sim, seria um mundo perfeito, ou quase. Também este texto foi, na sua escrita, protelado. Não foi por isso que se tornou melhor, apenas esteve mais tempo naquele limbo onde vivem os textos que estão à espera de ser escritos. Pois, se alguém pensa que os textos só existem porque alguém os escreve, posso afirmar que está errado. Qualquer texto, desde o mais incipiente até ao mais genial, existe a priori num estado potencial no mundo de textos à espera de se manifestar. Aquele que os escreve é apenas uma espécie de parteira que traz à luz do mundo a cria que existia já. Eu não escrevo estes textos. Faço o parto e eles nascem. Sou completamente irresponsável pela sua bondade ou maldade. Juro que é assim.
quinta-feira, 24 de abril de 2025
A mesa do lado
Hoje já fiz uma viagem de doze graus centígrados. Há quem meça a distância pelos quilómetros, há quem o faça pelos ponteiros do relógio. Eu sirvo-me do termómetro. Fui almoçar a certa praia do Oeste. Quando saí de lá, estavam dezoito graus, bem depois das duas da tarde. Ainda me demorei por aqui e por ali. Quando cheguei a esta cidade – cuja honra maior seria a promoção a vila, o que nos dias de hoje é impossível – estavam trinta. Como sempre, o peixe daquele restaurante é excelente. O problema é que não podemos escolher quem se senta na mesa ao lado. Calhou em sorte um casal – enfim, talvez não fosse um casal, mas um homem e uma mulher – em que ele mal abria a boca, seja para comer, seja para beber, seja para falar. Ela, porém, compensava a frugalidade dele e restabelecia o equilíbrio no mundo. A certa altura, o discurso dela voltou-se para a teologia. Que tinha lido qualquer coisa que não percebi, embora tivesse ficado desejoso de saber o quê. Asseverou que Jesus Cristo tinha sido casado com Maria Madalena, e deu uma explicação teológica: ele era Deus e homem, e, como homem, decidiu casar-se, mas não adiantou se tinha tido filhos e se fora feliz no casamento. Como Deus, fez todas aquelas coisas de multiplicar os pães, curar os doentes, ressuscitar os mortos e transformar a água em vinho. Tudo isso era verdade, está mais que provado cientificamente. Só não há filmes nem fotos, pensei, porque ainda não tinham descoberto o cinema, nem a máquina fotográfica. Quando ela pediu a segunda garrafa de vinho, deu a desculpa de que estava com muita sede, mas percebi que acreditava que ainda era um resto do vinho das Bodas de Canaã, e que era melhor aproveitar, não vá esgotar-se. O que me pareceu bastante plausível. Tinha uma cor rosada e não o vermelho tinto que teria resultado da metamorfose da água. Dois milénios sempre são dois milénios, e as antocianinas perderam o vigor, ficaram anémicas. A senhora, porém, não se preocupou com a anemia e, para compensar, pediu uma aguardente velha, com aquela cor castanha que faz lembrar sangue seco. Não devia escrever estas coisas. Sabe-se lá se são verdade. O pior foi a chegada, depois de doze graus de viagem.
quarta-feira, 23 de abril de 2025
Ramalhetes de papoilas
Hoje – finalmente – fui caminhar pelas ruas da cidade. Passei pelo parque, mas não era um parque de merendas. Não havia piqueniques de burguesas, nem ramalhetes rubros de papoilas, nem seios como duas rolas. As burguesas de hoje não andam de burro, deslocam-se a grande velocidade, não sabem o que são piqueniques nem papoilas – e, quanto aos seios como duas rolas, estamos conversados. Cesário Verde não escreveu papoilas, mas papoulas. Em contrapartida, no tempo dele, seria provável que o ouro fosse oiro. As pessoas iam aos toiros; hoje vão aos touros. Ninguém encontra tesoiros, mas também não descobre tesouros. Tesouro ou tesoiro, a coisa não se entrega a ninguém – ou quase. Foi isto que ocupou o vazio da minha mente enquanto caminhava? Não, claro que não. Isto ocorreu-me agora, pois aquilo que pensei evaporou-se. Esta ideia de um pensamento que se evapora contém uma importante lição sobre a mecânica do mundo – do mundo mental. Talvez o único mundo que exista seja o mundo mental, mas não vou discutir metafísica ou epistemologia a uma hora destas. A lição pertence à física – talvez à mecânica dos fluidos. A evaporação do pensamento é um fenómeno interessante porque o processo não é igual ao longo da vida. A princípio, o pensamento não se evapora porque não se pensa nada. Depois, o pensamento torna-se sólido e fica dentro de nós: são os primeiros princípios. Mais tarde, o pensamento sofre uma metamorfose e devém líquido – aquilo a que se poderia chamar a água do pensamento. Eu vivo, porém, noutra fase: a do pensamento gasoso. Mal penso, ele transforma-se em gás e evola-se, evapora-se – o que quiserem. Quando Joyce escreveu o Ulisses e o Finnegans Wake, o seu pensamento era líquido. Por isso, recorria à corrente do pensamento – ou da consciência. Era a água do pensamento a fluir dentro da cabeça dele. Eu passei directamente da fase sólida para a gasosa. Faltou-me a líquida. Se a tivesse, talvez ao caminhar descobrisse um piquenique de burguesas, que, sem posturas tolas, colhiam ramalhetes rubros de papoulas. A vida é perda contínua.
terça-feira, 22 de abril de 2025
Hesito, hesito
Voltou a luz sobre as ruas. A Primavera começa a inclinar-se para o futuro estival, ela que esteve tanto tempo fascinada pelo passado invernoso. Talvez por isso – penso-o agora – ela seja uma estação volúvel, de paixões irracionais e desejos inconfessáveis. É muito capaz de entrar em Maio com a forja de Vulcano debaixo do braço. Tê-la-á roubado ao deus, ele que é coxo e não pode perseguir ladrões. Sim, a Primavera é uma ladra contumaz, de personalidade inconstante; rouba a um lado e a outro as vestes com que se apresenta diante dos mortais, para lhes dar um horizonte onde eles – pobres criaturas decaídas – se entregam, como animais perdidos entre o deserto e a floresta, ao labor de cada dia. Estou sem assunto para escrever, coisa que me acontece muito à segunda-feira. Eu sei que estamos numa terça, mas penso – melhor, sinto – que estou no dia que vem depois de domingo. Este sentimento rouba-me o assunto, embora não me diminua a verborreia. Talvez tenha nascido voltado para a loquacidade, dado à facúndia, perdido no labirinto do verbo. Estive todo o dia a montar um engenhoso esquema para me facilitar certa tarefa que devo realizar. Agora que o concluí, constato que, se tivesse empregado o tempo na tarefa, já a tinha acabado. Novo problema: ou a inteligência é parca, ou não me serve para nada. O mais ajuizado será ir caminhar, aproveitar o sol – dizem que faz bem à vitamina D. Eu fico maravilhado, mas não me sinto motivado por isso. Não sou vitamina D. Se o fosse, nem hesitava; assim hesito, hesito, hesito se acabo este texto e vou para a rua, ou se o acabo e fico a descansar. Está uma tarde cheia de luz.
segunda-feira, 21 de abril de 2025
Glória
Os dias continuam soturnos. Ao longe, um baloiço range, tomado pelo desespero, expulsando o silêncio que o crepúsculo deixa cair sobre a terra. Abril, o mais cruel dos meses, dilui-se em água: um dilúvio. Abril, que faz brotar lilases da terra morta. Abril, que mistura memória e desejo. Abril, que agita raízes entorpecidas pela chuva da Primavera. O poeta via Abril por dentro, perscrutava-lhe a natureza, procurava-lhe a essência eterna. Os poetas não descansam, mas a essência das coisas pertence a um mundo que está vedado aos homens. Um poema é uma viagem para essa pátria cujas fronteiras estão fechadas, onde o mais terrível dos exércitos se entrega a uma vigilância infalível. A beleza – essa palavra que perdeu a graça – da poesia está nessa expedição que nunca atingirá o seu destino. Dela faz parte o naufrágio inevitável, que se manifesta no esplendor da linguagem, na cintilação de uma metáfora que, ao aproximar-se da essência procurada, a perde. É esta a sua glória.
domingo, 20 de abril de 2025
Domingo de Páscoa
A casa sossegou. Filhos, netos, famílias. Tudo isto é a memória de um tempo, já distante, onde o calendário religioso tinha impacto na organização da vida. Entre a vida e o calendário religioso cresceu um muro, que aqui e ali abre uma fresta e permite uma contaminação da vida pelo que resta da tradição. O almoço de Domingo de Páscoa não é mais do que um almoço profano, onde é possível juntar todos. Ontem estava a ouvir uma entrevista dada há um ano pelo historiador, antropólogo e demógrafo Emmanuel Todd. A certa altura, ele referia que os ocidentais evacuaram a religião e ficaram sem nada que dê sentido à sua existência. Há muito que percebi que, independentemente da existência ou não de Deus, a religião é uma vantagem competitiva da espécie na sua adaptação ao ambiente. É uma compensação da lucidez que a racionalidade traz ao homem. Um olhar lúcido vê a vida como um intervalo entre dois nadas. As religiões deram-lhe um sentido e um princípio de esperança. E isso permitiu à espécie evitar confrontar-se com o absurdo de uma existência que se resolve no nada. Talvez exista uma correlação entre o crescimento da descrença religiosa e a regressão demográfica, mas não conheço os dados empíricos. Os séculos XVIII e XIX ocidentais encarniçaram-se com a religião por esta ser um embuste, uma falsificação da realidade. Ora, a essa obstinação irreligiosa faltou fazer, com a seriedade de quem quer perceber um fenómeno, a pergunta fundamental: por que razão a humanidade, no seu processo evolutivo, teve necessidade de criar esse mundo a que se dá o nome de religião? Certamente que encontramos essa pergunta formulada, explícita ou implicitamente, em autores importantes, mas ela tem sempre a mesma natureza: é uma pergunta retórica, uma pergunta que não quer compreender, mas apenas suportar uma tese prévia. Estou soturno. Talvez porque a casa ficou vazia e o Domingo de Páscoa, mesmo para mim, não é mais do que um domingo.
sábado, 19 de abril de 2025
Em vias de extinção
Sob um sol quase radioso, as árvores do pequeno bosque da escola aqui ao lado agitam-se como se tivessem sido tomadas pela incerteza de como os seus ramos se devem erguer em direcção aos céus. Balançam para a frente e para trás. Ao longe, o hospital oferece as paredes à reverberação da luz, mas a cinza dos fungos impede que a cintilação se expanda. Notas sobre uma cidade que vejo de longe, apesar de viver dentro dela. Sou um narrador extrínseco à narrativa que componho. Há pouco, estive a contemplar as orquídeas floridas. Aproximam-se neste momento da dúzia; outras prometem fazê-lo em breve. São promessas mudas, mas talvez mais seguras do que muitas promessas vocálicas feitas pelos homens. Imagino que o acto de vocalizar uma promessa a faça perder energia para se cumprir. As orquídeas, como são destituídas de voz, não sofrem dessa astenia. Isto prova que ser dotado de linguagem não é uma vantagem tão grande quanto se pensa. A espécie humana gasta muita energia a falar — energia preciosa para fazer acontecer alguma coisa. Talvez seja por isso que, apesar do seu crescimento exponencial, a nossa espécie esteja na verdade em vias de extinção. A loquacidade está para os humanos como o asteróide esteve para os dinossauros. A bavardage — sempre podia ter escrito tagarelice, mas não escrevi, para me dar ares de douto — cobre a Terra com o seu fumo tóxico, e a humanidade definha, a começar pelo quociente de inteligência, que se encontra em regressão. Enquanto isto, as orquídeas ostentam, na simplicidade do silêncio, a sua beleza, e o mundo acabará por escolhê-las em detrimento de certos seres que nunca se calam. Onde me incluo, claro.
sexta-feira, 18 de abril de 2025
Hábito e destino
Para que serve o hábito? Foi a questão que pus a mim mesmo ao tomar consciência de que me tinha esquecido de escrever o post diário – embora este blogue não seja um diário. O hábito, ensina Aristóteles, é uma segunda natureza. Ora, que acontece à minha segunda natureza, se me esqueço do hábito? Será que perco a segunda natureza e fico só com a primeira? O problema dos hábitos é que eles ocultam essa primeira natureza – que já nem sei se alguma vez a tive. O hábito não funcionou na devida hora, mas acabou por funcionar, oiço dizer-me a mim mesmo. Não concedo, porém, assentimento ao que me digo. Um hábito efectivo é pontual; não falha a hora a que está destinado. Havia uma canção popular –ainda deve existir – em que o cantor asseverava que o destino marca a hora. Isso só é verdade se o destino for um hábito, pois é este que deve marcar a hora em que as coisas acontecem. Esta última frase trouxe-me uma súbita revelação sobre a natureza do destino. O que é o destino? Um hábito, uma repetição das coisas, de modo a parecer que elas sucedem porque tinham de suceder, estavam destinadas. A tese que me ocorre é que o destino é o hábito da natureza. Portanto, pode-se acrescentar: o destino é a segunda natureza da própria natureza. Esta é a minha contribuição de hoje – pro bono – para ajudar a humanidade a compreender o mundo em que vivemos. Não apenas é um momento alto na minha gesta gloriosa neste universo que me coube em sorte, como reflecte, para a eternidade, a luz baça – se não apagada – que de mim se desprende para iluminar as trevas exteriores. Um destino.
quinta-feira, 17 de abril de 2025
Relógios e relojoeiros
Um acaso levou-me a uma foto de um antigo relógio de parede. Para os conhecedores — que não é, de todo, o meu caso —,uma peça valiosa, dada a sua raridade. Uma particularidade deixou-me perplexo. No lugar dos tradicionais algarismos, tem um coração onde deveria estar o 6 e, nos restantes, letras que compõem a expressão latina TEMPUS FUGIT, que pode ser traduzida por o tempo voa ou o tempo foge. A perplexidade reside no propósito da inscrição. Um aviso? Uma ironia? O que significará avisar um mortal, cujo tempo é limitado, de que o tempo — aquele que lhe resta — voa, que em breve já não será? Sempre que consultar o relógio, ficará confrontado com a sua finitude. Isso terá um efeito perturbador e será uma porta aberta para a paralisia. Mergulhamos na vida porque suspendemos a crença na nossa mortalidade. Se somos continuamente confrontados com ela, qualquer esforço torna-se insensato para uma mente lúcida. Imaginemos, porém, que o autor da peça pretendia ironizar. A pessoa vê as horas e é recordada de que esse gesto é inútil, pois as horas que acabou de ver já pertencem a um passado que se afasta ao ritmo veloz do voo de um pássaro. Consultar um relógio seria, na óptica desse relojoeiro irónico, um acto absurdo. Entre o terror do sujeito e o absurdo da sua acção, há, naquele mostrador, uma crítica feroz aos tempos modernos. A modernidade ocidental — esse acontecimento emergente no século XVII — tinha por símbolo do seu mecanicismo o relógio. O mundo era um gigantesco relógio criado pelo divino relojoeiro, uma máquina precisa e matematicamente ajustada. Foi um século glorioso para a ciência e para a relojoaria. Essa glória, porém, escondia a evidência de que o tempo voa, que a vida continuamente se desfaz no nada, e que toda a consulta da informação no mostrador é um gesto inútil, pois ela torna-se, de imediato, desfasada da realidade. Talvez Deus, ao expulsar Adão e Eva do Jardim do Éden, lhes tenha dado, como castigo — para além daqueles que são enumerados no relato bíblico —, um relógio, ou a arte da relojoaria, para que não esquecessem aquele tempo em que o tempo não existia para eles. A suprema ironia do relojoeiro, porém, é o coração — essa declaração de amor, exibida sem pudor por aquele que acaba de ser lembrado de que desaparecer é o seu destino, ou de que querer saber as horas é o mais absurdo dos gestos. Talvez o relojoeiro fosse um ateu convicto. Ou estivesse em guerra com a suprema divindade.
quarta-feira, 16 de abril de 2025
Lapelas e colarinhos
Não sei o que pensar de mim. Isto acontece a muito boa gente, e talvez eu não seja tão bom assim. Passei, durante a hora de almoço, pelo canal Mezzo e deparei-me com um documentário sobre o violinista Itzhak Perlman. Fiquei siderado. Não com o virtuosismo do violinista, mas com as lapelas dos casacos que se usavam quando o programa foi realizado, talvez nos finais da década de setenta do século passado. Quando dei por isso, Perlman estava no estúdio, vestido informalmente, e conversava com os técnicos, suponho. Estes estavam de fato e gravata. Aquela época, pensei de imediato, só podia ser um tempo em que se cultivava a hipérbole, de tal maneira as lapelas eram enormes, uma espécie de asas que assentavam sobre o peito dos homens. A indumentária interessou-me, e reparei, de seguida, nos colarinhos das camisas. Também eles enormes. Sim, eu vivi aqueles dias, mas a memória já os apagou — Deo Gratias. Quereriam os homens, nessa era infausta, apassarar-se? Pertenceriam a uma seita da asa grande ou da super-lapela? Julgar-se-iam descendentes de Ícaro e que acabariam por levantar voo? Há épocas em que as lapelas se estreitam até ao limite do verosímil — se é que o verosímil tem limite — e em que os colarinhos das camisas se tornam tão discretos que mal se vêem. Talvez a moda seja cíclica, mas não sei nada do assunto. Admitamos, porém, que é verdade: a moda cumpre uma espécie de ciclo de eterno retorno, como aquele que existe na natureza. Isto significaria que teríamos épocas de grande expansão de lapelas e de colarinhos, e épocas de enorme retracção. Épocas de um optimismo desmedido e épocas de um pessimismo sem freio. Que nos diz tudo isto da espécie humana? A conclusão é simples: sofre de bipolaridade crónica. Isto é, não regula bem. Por mais que se tente educá-la na prudência e justo meio de Aristóteles, ela nunca deixa de ceder à mania das grandezas ou ao terror da pequenez. Estes são os meus pensamentos, e é por causa deles que não sei o que pensar de mim. Tenho de ir espreitar as lapelas dos casacos que estão cá por casa.
terça-feira, 15 de abril de 2025
Efeméride
Sou dado a efemérides. E hoje é uma. Não faço ideia se a data é memorável ou se nela ocorreu um facto digno de ser lembrado. Devem ter ocorrido vários. Não há dia do calendário que esteja despojado deles. Antes pelo contrário. As minhas efemérides, contudo, pertencem a outra ordem. Memorável é estarmos no meio de um mês. Hoje é o último dia da primeira quinzena de Abril, coisa que merece ser comemorada. Qual a razão? – perguntar-se-á. O simples facto de o mês ter conseguido chegar – ou quase, só lá chega à meia-noite – a meio, não deixa de ser uma grande vitória do calendário. As pessoas julgam que um mês chegar a meio não passa de uma trivialidade. Ora, cometem um erro com funestas consequências. O facto de todos os meses de Abril de que nos lembramos terem chegado a meio, isso não nos garante que este o fará. É uma possibilidade, mas quem nos certifica de que o universo não colapsa nas próximas horas? Quem tem a chave para interpretar a vontade obscura desse ser monstruoso na sua grandeza sem limites? Se estivermos conscientes disto, percebemos uma coisa simples: o mês de Abril chegar a meio não é uma trivialidade, mas um milagre, um acontecimento excepcional, merecedor de ser considerado uma efeméride. Onde está o funesto anunciado acima? O facto de não reconhecermos o milagre pode irar o monstro, e este, na sua monstruosidade, só para punir a nossa insolência, decidir colapsar. O que seria desagradável. Ora, se há trivialidade mais que experimentada, essa é a emergência de coisas desagradáveis.
segunda-feira, 14 de abril de 2025
Sem stock
O meu problema é ter a cabeça vazia. Acontece-me com frequência – ou será melhor dizer amiúde? – às segundas-feiras. Chego a certa hora e o que, de manhã, tinha dentro dela desaparece. O processo é outro: não se trata de uma súbita evasão. As ideias começam a ir-se cedo, num escoamento gradual que só se completa a esta hora – caso estejamos numa segunda-feira, insisto. Queria qualquer coisa para escrever, procuro no armazém, mas não há stock disponível. Nos outros dias não é assim: a esta hora ainda há uma boa reserva de ideias. Tenho reflectido sobre o caso, mas não encontrei explicação plausível. Pode pensar-se que “ter a cabeça vazia” não passa de uma expressão retórica e que, na realidade, haverá sempre lá qualquer coisa. Não. A expressão é literal. A minha mente – que se supõe estar dentro da cabeça – é uma ausência. Sim, tenho um cérebro, mas é como se não tivesse. Os neurónios entraram em greve: não fazem sinapses. Seria um drama, se fosse irreversível. Não é. Não posso, no entanto, provar esta última afirmação: trata-se de uma previsão e, como se sabe, o futuro escapa à certeza. A greve neuronal pode, no meu caso, ser eterna. Resta-me a esperança de que não o seja – que não seja greve, mas apenas cansaço.
domingo, 13 de abril de 2025
Ingratidão
Deveria escrever textos mais curtos. Vivemos na pós-modernidade, e esta exige textos da dimensão de um tweet — embora essa expressão possa já ter caído em desuso, pois o Twitter tornou-se X. Dito de outro modo: deverei ser ou não ser um pós-moderno? Isto, porém, não me atormenta. O que me mortifica é a ingratidão dos objectos. Sim, as pessoas adoecem só de pensar na ingratidão dos outros — mas eu, não. Um herói pós-moderno (talvez o seja) preocupa-se com outro tipo de questões. O caso é simples: tenho uma balança com a qual mantenho uma relação conflitual. Contudo, perdeu energia e eu, num gesto de benevolência, comprei-lhe uma pilha, salvei-lhe a vida. Agradeceu? Mal a pisei, devolveu-me um quilo a mais do que da última vez. Em vez de gratidão, justicialismo. Que as pessoas sejam ingratas, percebe-se — há nelas uma inclinação para o mal. Que os objectos, onde não existem inclinações, apenas regras mecânicas, o sejam — isso sim, deveria pôr-nos em estado de choque. Disse-lhe: A próxima vez que estiveres morta, deixo-te assim por uns meses. Como resposta, acrescentou trezentos gramas ao peso anterior. Ficou a olhar para mim com aquele ar estúpido de balança, o que me deixou constrangido e levou-me, para minha vergonha, a explicações que soaram como desculpa: o mau tempo impede-me as caminhadas. Ela bocejou — e, naquele bocejo, havia todo o desprezo deste mundo e do próximo. Estas são as verdadeiras tragédias da pós-modernidade. Sobre elas, há que escrever pouco, pois pouco há para dizer. Hoje é domingo — e, depois disso, a única coisa que me ocorreu é que amanhã será segunda-feira, a não ser que também a organização da semana de sete dias tenha aderido à pós-modernidade e pratique a ingratidão de confundir os dias na vida dos mortais.
sábado, 12 de abril de 2025
Dias de sombra
Está um sábado tristonho, indeciso, ora ameaçando tempestade, ora prometendo tempo de praia. Isto tem sobre mim um efeito desagradável, talvez dois. Em primeiro lugar, interfere com o corpo, tornando-o dorido aqui ou ali. É da instabilidade do tempo, penso. Melhor seria tomar um analgésico e deixar de pensar. O segundo efeito é tornar-me mais cinzento do que o habitual. Tinha uma tese – aposto que falsa – sobre a minha perfeita conformação com o tempo do norte da Europa: a má relação com o calor e uma certa configuração física. Ora, este ano tem sido um teste ao meu enraizamento ancestral em terras sombrias. Resultado: estou farto deste tempo. Venha sol, mas sem grandes calores. Quero luz, não ser cozinhado em lume pouco brando. Agora chove sem pudor. Há uma tristeza neste cair da chuva que toca toda a cidade, tornando-a mais pequena e humilde do que aquilo que ela é. Ao longe, troveja. Diante de mim tenho dois livros de Georges Simenon. Não se pense que são Maigrets. Não são. São dois romans durs, segundo a própria qualificação do autor. A Cavalo de Ferro publicou As Janelas Defronte e A Neve Estava Suja, dois entre largas dezenas de romances que Simenon escreveu sem ter o inspector Maigret como protagonista. Além de duros, são sombrios, o que seria de esperar de um escritor belga. São romances que estão em linha com o clima que se faz sentir por aqui. Vou aguardar dias mais luminosos para os ler. Simenon, seja dito, é um grande escritor, um dos maiores em língua francesa, língua em que existem grandes escritores, pois um escritor só existe na língua em que escreve. Aqui, porém, já estou a especular. O homúnculo que vive em mim corrigiu-me de imediato: não estás a especular, estás-te a armar aos cucos. Esta é uma expressão que corria muito por aqui, não sei se ainda corre, e também não sei se é um mero regionalismo ou se todo o país está disponível para atirar à cara de alguém: estás a armar-te aos cucos. É provável que seja um nacionalismo. Seja como for, o homúnculo, meu inimigo, conhece-a bem.
sexta-feira, 11 de abril de 2025
Dos simples e da sua simplicidade
O mundo exterior invade-me o escritório: o grupo musical da escola secundária vizinha teima em ensaiar música dos anos sessenta e setenta do século passado, enquanto um bando de adolescentes ocupa o tempo, com o vozear que lhe é próprio, antes de entrar para o instituto de línguas. Não sei o que é pior; talvez nenhuma das coisas seja um mal em si mesma — só a sua conjugação se torna um pouco disruptiva. Num dos textos sobre cultura, Antonio Gramsci diz, não sem cândida inocência: a filosofia da práxis não tende a manter os «simples» na sua filosofia primitiva do senso comum, mas, pelo contrário, a conduzi-los a uma concepção superior de vida. Polemizava com aquilo que seria a filosofia católica, a qual, depreende-se, desejaria manter os simples na sua simplicidade. O equívoco de Gramsci reside no pressuposto de que os simples querem abandonar a sua simplicidade e o doce conforto do senso comum. Gramsci morreu em 1937, e a denominada filosofia da práxis ainda não tinha feito a prova do tempo. Talvez hoje Gramsci tivesse menos ilusões. Pensa-se sempre que a simplicidade dos simples — para nos mantermos fiéis ao jargão do pensador e político italiano — se deve a uma estratégia dos opressores, da qual a filosofia católica seria um instrumento. Quando as sociedades se abrem à possibilidade de os simples saírem da sua simplicidade, são eles que gritam contra quem os queira tirar desse lar, onde se sentem, verdadeiramente, chez-soi. Quem ler com atenção a célebre Alegoria da Caverna percebe que já Platão tinha percebido isso. Ora, Nietzsche, na sua relação intempestiva e destrambelhada com o cristianismo, disse que este não passava de um platonismo para o povo — e nisso terá alguma razão. Isto permite afirmar o seguinte: se Platão percebeu que o desejo dos simples é manterem-se na sua simplicidade, então também o cristianismo o compreendeu. Corolário: a filosofia católica percebeu muito melhor o desejo dos simples do que a filosofia da práxis. Os simples não desejam uma concepção superior de vida, mas ouvir umas músicas do seu tempo de juventude ou deixar o som vibrar com vigor nas gargantas, se vivem na simplicidade da adolescência. Tenho de ir com o meu neto ao parque infantil.
quinta-feira, 10 de abril de 2025
Trovoada
Também os deuses envelhecem. Quando novos, a sua ira é terrível. Envelhecidos, resmoneiam entre dentes, numa rezinga a que nem os mortais dão atenção. Refiro-me, claro, a Zeus — ou, em versão latina, a Júpiter — o deus dos deuses. Quando eu era mais novo, tenho ideia de que havia por aqui trovoadas épicas. Relâmpagos, raios e coriscos — tudo acompanhado com o ribombar exaltado dos trovões. Era uma ira magnífica, que só acabava quando as nuvens vertessem, em abundância, uma água também ela irada, que tornava as ruas num rio revoltoso. Oiço agora o rezingar de Zeus, mas uma coisa débil, sem energia, nada de relâmpagos. Apenas uma atmosfera abafada, calor ainda a esta hora, os corpos a pedir uma bela trovoada, uma grande chuvada que limpasse os corações e as mentes — poluídas que andam dos negócios da vida, pois, como se sabe, não há coisa mais poluente do que a vida. Uma possibilidade, porém, é que a antiga ira dos imortais seja mais imaginada do que real. Será que as antigas trovoadas seriam tão épicas quanto me parecem agora? Juraria que sim. Fecho os olhos e ainda as oiço e vejo. Magníficas. Todavia, o mais sensato será não jurar, para não faltar à verdade. Está um crepúsculo arrastado, um céu cinzento, uma noite que não cai. O mundo está fora dos eixos, e não é minha missão colocá-lo no lugar, nem endireitar tortos. Sou um herói sem causa, nem vilões para enfrentar, nem gesta para me elevar à glória. Comento trovoadas com recurso à mitologia, mas não descendo dos deuses. Não sou um Aquiles — mas também não tenho o calcanhar dele. Terei os meus, claro.
quarta-feira, 9 de abril de 2025
Procrastinar
Procrastino. Que palavra esta. Olho para ela e decido tentar perceber de onde vem. Vou consultar um dicionário, para que me informe acerca da sua origem ou, melhor, da etimologia do verbo procrastinar. É dada a informação de que vem do latino procrastināre, com o mesmo significado. Decepção. O próprio dicionário procrastinou o meu esclarecimento. Eis um sinal importante. Talvez a procrastinação não seja um problema meramente humano, mas que toda a realidade procrastine, a começar pelos dicionários. Não posso procrastinar a aquisição do sentido etimológico do verbo que traduz o meu estado em relação a um conjunto de coisas que tenho de fazer. Recorri a uma conversa com um bot. Foi muito mais esclarecedora. O prefixo latino pro indica “para diante”, “em direcção ao futuro”. Por outro lado, cras é um advérbio que significa “amanhã”. A isso adiciona-se o sufixo -ināre, comum nos verbos da primeira conjugação, que forma verbos de acção. Sinto-me, relativamente, esclarecido. A minha inclinação procrastinadora significa a acção de atirar (algo) para amanhã. Contudo, sinto-me apanhado numa armadilha: eu não quero agir, não quero praticar uma certa acção, mas, mesmo assim, pratico a acção de enviar qualquer coisa para o futuro, para amanhã. Uma injustiça. O que eu queria era não agir de qualquer forma. Haverá, no meu desejo, uma forma de pensamento mágico: em vez de enviar para amanhã a acção objecto da minha procrastinação, aquilo que em mim ressoa é o desejo de que isso, pura e simplesmente, não exista. A essência da procrastinação não está em adiar para amanhã, mas no desejo de que qualquer coisa não tivesse vindo à existência. Por hoje, chega de contributos para esclarecer a verdade que se esconde nas palavras que estão disponíveis para uso comum. Procrastino novos esclarecimentos.
terça-feira, 8 de abril de 2025
Ensaio sobre a estupidez
Não tenho a certeza, mas, não poucas vezes, sou assaltado pela crença de que a eliminação da estupidez na espécie humana seria um contributo assinalável para que todos pudéssemos viver uma vida mais decente. A incerteza nasce de gente inteligente – ou mesmo muito inteligente – ser mais capaz de causar problemas graves aos outros do que gente idiota. No entanto, podemos pensar que alguém inteligente, ou muito inteligente, pode ser um rematado estúpido, pois a maldade, em última análise, não deixa de ser uma estupidez, uma enorme estupidez. Contudo, a maldade praticada por estúpidos destituídos de um módico de inteligência é uma cruz difícil de suportar pela espécie humana. Na maldade proveniente de uma mente brilhante, por terrível que seja, há ainda um lado estético, tal como acontece num lance brilhante de um qualquer desporto. Na maldade originada apenas pela limitação da capacidade neuronal, só há desolação. Agora que há empresas que conseguem, através de manipulação genética, trazer à vida espécies que se encontravam extintas há milhares de anos, talvez se possa conceber uma manipulação do genoma humano com a finalidade de eliminar a estupidez — tanto a derivada do baixo uso neuronal, como a resultante de uma elevada qualidade do trabalho dos neurónios. Perguntar-se-á a razão deste discurso. Bem, não é difícil: basta olhar para o estado do mundo. Outra razão: não me ocorreu mais nada.