“On s’habitue c’est tout”, foi isto que pensei enquanto
bebia um copo de sumo de toranja. Quando introduzi este ritual na minha pacata
existência, o sabor agreste – para não dizer amargo – da toranja era ainda uma
revelação que me dava um prazer especial. Os anos passaram, a cerimónia matinal
consolidou-se e, hoje em dia, confesso que o sabor do sumo começa a parecer-me
demasiado doce. Foi por causa disso que me lembrei do verso da canção de Brel.
Uma pessoa habitua-se e é tudo. Como sou um tipo anacrónico, quando era novo,
enquanto os outros rockavam por tudo e por nada, eu ouvia música francesa e,
entre todos os grandes da canção francesa, o de que mais gostava era do Brel,
que por acaso não era francês, mas belga. Ainda hoje gosto bastante, mas aquele
pathos do “ne me quites pas” não me comove
ou não cai bem com a minha disposição de ânimo. Tudo isto pertence a um tempo
em que eu tinha tão pouca idade que pensava que era existencialista. Lia os
romance do Sartre e do Camus, sonhava com a rive
gauche e achava que não poderia haver melhor coisa no mundo do que estar
condenado à liberdade. Isto alguma influência teve na minha vida, mas é melhor
nem pensar nisso. Agora, bebo sumo de toranja pela manhã e lembro-me de restos
de canções do Brel. “On s’habitue c’est tout”.
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