terça-feira, 13 de abril de 2021

O galope do tempo

Nunca tinha passado por aquela rua. É espantosa a minha falta de curiosidade. A cidade é pequena e vivo nela há muitas décadas. Apesar disso ainda há rua antigas pelas quais nunca passei. Na caminhada de hoje, descobri uma. Pequena, pouco mais que uma travessa, com moradias baixas. Fez-me pensar nas aldeias de antigamente. Pequenos jardins, nespereiras e limoeiros, um ar de tranquilidade, de um lugar onde as pessoas levam uma vida sensata, em que o dia e a noite se distinguem com clareza. Agora oiço o Quator pour la fin du Temps, de Messiaen. A sua tonalidade apocalíptica choca com a rememoração tranquila do passeio dado. O compositor escreveu a obra quando estava preso na Alemanha pelos nazis. Não tinha à disposição ruas pequenas com casas orladas por árvores de fruto, nem um sentimento de sensatez. Ali, onde o reinaria a maior ausência de sentido, só o fim do tempo poderia dançar na imaginação com uma promessa de libertação. Anoitece, o tempo galopa, galopa, mas talvez não tenha um fim que o liberte da sua correria desenfreada.

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