Hoje o dia tem estado, por aqui, particularmente tristonho. Vento de sudoeste e uma chuva moderada, mas inquieta, toldam o horizonte. A temperatura não passará dos 17o. Apesar da tristeza, as pessoas andam pela rua, erguem guarda-chuvas e vão com o passo lento, como se se quisessem demorar e, desse modo, tomar parte da melancolia que escorre de todo o lado. Os pássaros remeteram-se ao silêncio. Apenas as orquídeas, no seu friso, se entregam com volúpia à exuberância da beleza, mesmo as duas mais contidas, que apresentam uma floração quase rente à terra do vaso. No bar, do outro lado da avenida, há pessoas na esplanada. A saudade de estar em lugares assim deve ser de tal modo grande que afrontam com fervor, disfarçando incómodos, a indisposição do clima. Há dias encomendei em Inglaterra um livro de arte, mas já não me lembro qual, nem a razão por que o fiz. Deve-me ter parecido de grande importância e de suma urgência fazê-lo, agora já nem consigo ordenar as razões do acto. Há muito que descobri que a vida é isto. Aquilo que parece crucial numa dada hora, será visto na seguinte como despiciendo e esquecido na terceira. Ou então sou eu que fui criado com um carácter volúvel. Leio um email recebido e, de imediato, sinto uma grande saudade do tempo em que os homens eram tratados por senhor seguido do último apelido e não por senhor mais nome próprio. São coisas destas que mostram que o mundo se transforma. Chove bem neste momento, a inclinação da água confirma o vento de sudoeste.
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