segunda-feira, 10 de maio de 2021

A língua originária

Fui trocar a lâmpada fundida de um dos piscas. Custou, com o trabalho de tirar uma e colocar outra, um euro e meio. Fiquei espantado, pois pensava que iria pagar mais. Talvez as lâmpadas dos carros tenham desvalorizado ou a vida na província seja mais barata. O dia alterna períodos de aguaceiros intensos com outros de sol, num Maio que, felizmente, ainda não mostrou as suas garras feitas de calor. Leio, num livro de um famoso teólogo alemão do século XX, que Salimbene, um frade franciscano do XIII, conta uma história terrível de Frederico II de Hohenstaufen. Este mandou recolher vários órfãos ainda em período de amamentação. Ordenou que fossem tratados da melhor maneira possível. No entanto, era rigorosamente proibido falar com eles. Aqui descobre-se, em Frederico II, um verdadeiro ímpeto experimental, pois a finalidade da proibição seria verificar qual a primeira língua que, espontaneamente, as crianças falariam, se o latim, se o hebreu, se o grego, as hipóteses de base do experimento. Desse modo descobrir-se-ia qual a língua originária dos homens. A verdade é que as crianças não começaram por falar nenhuma delas, nem sequer o dialecto dos pais, mas morreram. Morreram à míngua de palavras, literalmente. A tarde progride, as pessoas deambulam vagarosas pela avenida e eu penso que é uma bênção viver num mundo em que aos reis e magistrados não lhes é permitido entregar-se a devaneios experimentais. Muito gostam os homens de endeusar o passado, mas quando visto de perto, descobre-se um filme de terror.

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