segunda-feira, 31 de maio de 2021

Prolegómenos

O crepúsculo é cada vez mais tarde, pensei ao olhar para a luz ainda viva. Mais logo virá a noite com o seu império feito de trevas, a vida adormecerá lentamente, até que a aurora faça soar as trombetas, para que homens e animais retomem a azáfama que a despótica realidade lhes impõe. Leio, num poema de um poeta polaco, que um alemão na esplanada de um café tinha sobre os joelhos um pequeno livro. O título era Mística para Principiantes, e o poeta foi descobrindo, nessa língua incompreensível que é o polaco, que tudo o que sucedia não seria outa coisa que uma introdução ou uns prolegómenos a essa mística, seja ela o que for e qual for. O tradutor cometeu um deslize e traduziu prolegomena por prolegómeno, mas a palavra não existe em português a não ser no plural. Consultei o habitual dicionário da Porto Editora e o indispensável Houaiss. Aliás, prolegomena é uma palavra latina que se encontra no plural. Noutra encarnação, quando me dedicava a coisas para as quais não tinha qualquer competência, li um livro com o épico título Prolegómenos a Toda a Metafísica Futura que Queira Apresentar-se como Ciência. Hoje em dia, consumada a minha falta de préstimo para prolegómenos, introduções e prefácios, escrevo uns pequenos textos insípidos e que, se utilizados com cuidado, permitem bocejar, e como se sabe todos os bocejos são autênticos prolegómenos ao sono.

Sem comentários:

Enviar um comentário