domingo, 25 de julho de 2021

Do sofrível

Ontem acabei o texto com a palavra sofrível. A primeira vez que me lembro dela foi num certo colégio por onde andei a seguir à quarta classe. Fazia parte de uma estranha escala de classificação. Situava-se acima do medíocre e abaixo do suficiente. Imagino que o sistema classificativo do colégio estivesse já desadequado, mas talvez seja apenas eu que sou muito mais velho do que gosto de admitir. Não consigo imaginar as razões que terão levado alguém a transformar um adjectivo que diz que algo se pode suportar ou sofrer num nome que refere um certo desempenho escolar. Seja como for, os professores daquele tempo tinham uma escala mais ampla para classificar as provas e, quando estavam cansados desta, juntavam-lhe mais e menos. Os alunos, então, tinham suficiente menos que não se confundiria com sofrível mais, como o bom menos não era em nada idêntico ao suficiente mais. Tive uma professora de Físico-Química que se entretinha a distribuir medíocres e maus com vários menos e mais à frente, numa escala cujos arcanos só ela conheceria. Desconfio que, naqueles dias, a profissão de professor era muito entediante e havia que passar o tempo a inventar estes jogos classificativos. O lamentável de tudo isto é que a palavra quase caiu em desuso. Ninguém diz mas que filme sofrível ou aquele é um poeta sofrível, embora eu possa dizer que a minha inspiração está sofrível ou talvez mesmo medíocre, com um mais à frente.

3 comentários:

  1. Já me fez sorrir. Também sou desse tempo dos mais e menos à frente das inúmeras hipóteses de classificar um teste - ou seria ponto? Creio que dizíamos «amanhã temos ponto».

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  2. Part II (como nos filmes)

    Carreguei no publicar antes de tempo 😔
    Disseram-me que agora não dão negativas para não traumatizar as crianças, mas não sei se é verdade. De qualquer modo, ninguém merece um sofrível menos ou um mau mais.

    Tenha um excelente dia, HV.
    🌼Maria

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    1. Claro que era um ponto. Teste deve ser uma coisa bem posterior. Além de não haver sofríveis, desconfio que já não existem medíocres e maus, agora é insuficiente. Mas uma grande colecção de insuficientes, através de uma mutação qualitativa e intervenção do Espírito Santo, transforma-se no final do ano em suficiente.

      Um bom dia, Maria
      HV

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