Diante de mim jaz o romance de Carlos de Oliveira, Pequenos Burgueses. Aguarda que a realidade se desanuvie para que eu prossiga na sua releitura. Ler é reler, alguém terá dito, mas não me ocorre quem. Voltando ao romance de Oliveira, o título levou-me a uma associação com um poema de Mário Cesariny. Aquela que começa e acaba com a seguinte quadra: Burgueses somos nós todos / ou ainda menos. / Burgueses somos nós todos / desde pequenos. Quando tinha escassa idade, mas já a suficiente para me interessar por coisas que talvez não me devessem interessar, a vexata quaestio da pequena-burguesia, com hífen, estava muito na moda. Havia debates e vitupérios em torno dessa inconsolável e inconsolada classe social, bem como da definição e extensão do conceito que a deveria definir. O poema do Cesariny mostrou-me a solução do enigma dos pequeno-burgueses. São aqueles que são burgueses desde pequenos. Por pequeno pode-se pensar aqueles que são crianças, aqueles que são pequenos de altura, aqueles que o são de carácter, aqueles que o são de rendimentos. A poesia abre as palavras à polissemia e essa salva a alma de quem a lê, ou a relê, mesmo que a finalidade seja tresler. Hoje é domingo, já cumpri um conjunto diversificado de tarefas, mas ainda tenho mais algumas para realizar. Hoje, por hoje, sigo aquele sábio conselho – de claro teor pequeno-burguês – não guardes para amanhã o que podes fazer hoje. Nada de procrastinar.
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