Na praceta entre os prédios, um bando de rapazes joga à bola sob o sol de Abril. Como eu, as nuvens esparsas param e olham-nos estupefactas. Também joguei inúmeros e decisivos jogos de bola na rua, com regras inventadas e jogadores preocupados apenas que passasse um polícia e que, para assegurar o princípio da sua autoridade, nos ficasse com a bola. A folhagem das árvores da escola ao fundo da rua inclina-se, tocada pelo vento, batida pelo sol. Um cão ladra, pessoas entram e saem do café, e eu penso nesses jogos onde todos os sonhos eram possíveis e toda a honra estava ao alcance de um pontapé certeiro ou toda a perdição no estilhaçar de um vidro atingido pelo excesso de empenho do jogador. Um poema de Eugénio de Andrade diz-me que em abril / os dias são /frágeis, impacientes e amargos, mas eu já não acredito. Aqueles rapazes, uma projecção perdida no tempo da minha infância, julgam os dias de Abril gloriosos e eternos, pois toda a glória e toda a eternidade se resumem ao momento em que o pé encontra a bola e a garganta grita golo.
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