Mais composto de águas, o Tejo corre sereno e afável, convidando a quem se senta numa das margens à contemplação. O pior é o azougue dos aguaceiros que a inconstância da Primavera, indiferente aos ânimos contemplativos, ameaça. Nem todas as ameaças são para cumprir, penso enquanto pouso o olhar nas águas que se encaminham inexoráveis para a foz. Entre conversas, observo que é quinta-feira de Endoenças e que a Semana Santa, perante a indiferença dos negócios humanos, corre para a sua hora crucial. Não tarda, tudo estará consumado e a segunda-feira virá cobrir com o véu do esquecimento estes dias. Uma águia cruza os ares e pousa numa árvore da outra margem. Nesse instante, um pequeno barco inicia a travessia para atracar deste lado, num cais frustre e precário, como tudo na vida. As crianças saltam à corda numa clareira e despem as camisolas, afogueadas pelo sol e pelo ritmo das entradas e saídas no jogo. São horas como estas que permitem compreender por que não há perfeição maior que a quietude. Sinto o tempo deslizar por mim, enquanto, por detrás de um choupo, a eternidade sorri-me, lembrando-me que sou finito. O melhor é irmos para o carro antes que chova, digo em tom imperativo, como se fosse um desses profetas irados que abundam nas redes sociais.
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