quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Descobertas tardias

Hoje passei pela Biblioteca Municipal. Descobri que ali havia a velha tradução de Paulo Quintela de Os Cadernos de Malte Laurids Brigge, de Rainer Maria Rilke – sim, Rilke mais uma vez. Eu tenho uma outra tradução da obra, a de Maria Teresa Dias Furtado, para a Relógio d’Água. A do professor Paulo Quintela foi publicada pela Editorial Inova, do Porto. Percorro-lhe as páginas e irrito-me. Existem sublinhados e anotações nas margens. É certo que são feitos a lápis, mas o livro é público e o seu utilizador não tem o direito de o conspurcar com os seus pensamentos, se é que são pensamentos. Eu sei que existe, na mesma biblioteca, um outro exemplar. Faz parte do espólio deixado por alguém que conheci. De súbito, retornou, vinda de um tempo arcaico, a sua imagem de mulher, um pouco descompassada das imagens das outras mulheres – raparigas, quero eu dizer – que por aqui havia. Enquanto viveu, nunca soube que lia Rilke e, agora que o sei, desconfio que esse meu não saber talvez tenha sido uma perda irremediável. Há coisas que se descobrem demasiado tarde. Se fosse o seu exemplar que estivesse nas minhas mãos, aquelas podiam ser as suas palavras, e eu haveria de as ler como se fossem uma revelação.

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