domingo, 31 de março de 2019

Vergonha

A certo passo, no romance A Pele, Curzio Malaparte diz «É uma coisa humilhante, horrível, é uma necessidade vergonhosa lutar para viver. Só para viver.» Leio estas palavras não sem uma inquietação, não sem uma suspeita. Talvez a suspeita tenha nascido da escuridão da noite ou das tarefas a que durante o dia tive de me entregar para, isso mesmo, viver. A suspeita soletra dentro de mim que a vida não é outra coisa senão a luta pelo mero viver. Esse é o combustível que a anima e, para um ser racional, a vida não é mais do que um exercício de humilhações, uma vergonha que disfarçamos porque não suportamos a ostentação sem fim do acanhamento que tolhe a alma. O domingo não tarda a acabar e virá uma semana de afazeres. Não terei tempo de pensar nisso, reparo não sem alegria. Talvez seja por falta de tempo que perdemos o decoro, meditei, enquanto pensava no que iria fazer a seguir.

2 comentários:

  1. Vergonha é o que eu sinto por nunca ter lido nada deste autor, e de apenas o conhecer pela fabulosa casa onde o Godard rodou Le Mépris.
    Tanto livro importante que ainda me falta ler... e este é, seguramente, um deles.
    Pesquisei e não vai ser nada fácil encontrá-lo.
    Mas o que li aqui (e num outro blog) tocou-me de tal maneira que tenho de conseguir lê-lo.

    M

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    1. Nos alfarrabistas não é difícil de encontrar este romance. Foi lá que o encontrei.

      HV

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