Talvez ninguém leia Somerset Maugham, eu não o faço, embora tenha alguns livros dele. Há muito tempo, contudo, li O Fio da Navalha, que me deixou bastante impressionado, mas perdi o rasto a esse livro publicado pela gloriosa editora Edições Livros do Brasil. Mais tarde, tornei a comprar a obra, numa edição da ASA. Não voltei a ler o romance e não sei já o que me terá impressionado nesse tempo tão longínquo. Talvez fosse excessivamente impressionável, embora não seja essa imagem que cultivei de mim. Peguei, há instantes, em Mrs. Craddock, que nunca li, e abri a obra ao acaso, como muitas vezes faço. Li, na página 227, início do capítulo XXV, o seguinte: Se os deuses, que espalham a inteligência nos lugares mais inesperados – é encontrada, às vezes, sob a mitra de um bispo e, de milénio a milénio, na cabeça de um rei –, houvessem concedido a Edward Craddock um pouco desse precioso artigo, talvez ele fosse um grande homem, além de ser um homem bom. Imagino que seja de equacionar uma visita ao universo de Maugham. Talvez os deuses tenham sido tão avaros comigo quanto com Edward Craddock, e seja, como ele, um pequeno homem, embora, duvido que de mim se possa dizer que sou um homem bom. O que me entristece, reconheço, mas nem a bondade nem a maldade fazem parte do meu lote, daquilo que me calhou. Enfim, do mal o menos, a aurea mediocritas é melhor que nada. Leio mais uma passagem: Enquanto isso, Edward, alheio ao que estava sucedendo, assemelhava-se a um louco que, num hospício, exercesse poder monárquico sobre um reino imaginário. Não se dava conta da maneira desdenhosa como Bertha (a mulher) o tratava; notava, isso sim, que ela já não era tão exigente, e isso tornava-o feliz como nunca. Quer dizer: o casamento só se tornou plenamente satisfatório para Edward quando Bertha começou a perder a estima por ele, assunto que certamente interessaria a um filósofo irónico, disposto a tirar conclusões de fundo moral. Por hoje, chega de citações.
Somerset Maugham. Dele li Servidão Humana, O Mágico e Moon and Six Pence. É um grande escritor esquecido.
ResponderEliminarA citação seria tão fictícia quanto real, substituindo Bertha por Catherine e Edward por Edgar Linton, etc.
De Maugham (e não Maughan, como escrevi), só li O Fio da Navalha. Tenho o projecto de ler Servidão Humana, um dia destes.
EliminarCom 17 anos, eu e os meus amigos, de então e de agora, depois de ler o Fio da Navalha, adoptámos o Larry como modelo de vida. Esse é um livro que continua a ser um dos livros da minha vida.
ResponderEliminarS M nunca desilude, e a Servidão Humana tem uma frase terrível e quase premonitória para todos os homens. Diz o protagonista, " E pensar que quase estraguei a minha vida, por uma mulher que nem sequer era o meu tipo". E S M era gay,para além de espião ao serviço de sua majestade .
Outro livro dele a ler: O mágico.
De O Fio da Navalha não recordo nada. Tenho a sensação - porventura, sem fundamento - que está ligado a uma certa vertigem experimentada no voo, uma espécie de abertura para uma outra dimensão. Talvez alguma coisa que se assemelhasse aos livros de Hermann Hesse, mas não sei precisar.
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