Olha-se o céu e percebe-se que também o Inverno é finito. No declínio da tarde, pressente-se a morte da estação fria. Na linha do horizonte, atrevida, a Primavera assoma, faz trejeitos e acena para a multidão de basbaques que a aguarda. Antes de chegar, suspeita-se que é bela como uma estrela de cinema, daquelas que todos querem ver, não porque represente bem, mas apenas porque foi tocada pela maior das graças, a da beleza. Depois, haverá de envelhecer, criar rugas de calor, num rosto que se desfigura com o passar das horas. A repetição do drama das estações, porém, nunca cansa, pois, ao nascermos, foi-nos dada uma inclinação para querer ver sempre um novo ciclo, para nunca nos cansarmos com a repetição de cenas e quadros. Pelo contrário, com o passar do tempo criamos um ciclo ideal, nunca se sabe quando e como, e, ano após ano, esperamos que ele se repita exactamente como a nossa fantasia o desenhou. A dissonância e a novidade dentro de cada estação causam-nos um profundo desagrado, como se alguma coisa no mundo saísse fora dos eixos e não houvesse quem a fizesse voltar ao lugar. Isto são pensamentos de quem envelheceu, de quem, quando era novo, não pensava nas estações, nem nos ciclos, nem se incomodava com a irregularidade do que acontecia. É uma forma de cismar ao sol nos dias frios de Inverno, de se entregar ao silêncio, enquanto um gato atravessa a rua e um sino toca numa memória muito antiga.
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