Um céu azul onde navegam, como barcos de guerra, nuvens de cinza e cal. Parecem cordatas, mas se algum comando inquieto lhes fende a bonomia e o torpor, estão prontas para disparar os canhões de água. Retornei ao exercício da hipérbole. Talvez seja o efeito do Picetoprofeno com que pulverizei o pobre do calcanhar. O odor do produto entranha-se pelas narinas, sobe ao cérebro e deixa-o incapaz de se medir com a realidade. Na descrição da droga está escrito que entre os excipientes se encontra a essência de lavanda. Ainda bem, pois se não estivesse nem sei como seria possível suportar o aroma que se evola a cada pulverização e que persiste no pé, se agarra à meia e se cola ao septo nasal. Também é verdade que entre os tais excipientes se encontra a cânfora. Em tempos, constava que nas cantinas militares misturavam cânfora com o vinho que era dado aos soldados, para fazer baixar a libido. Ora, não é sem surpresa que leio que essa mesma cânfora é um potenciador do desejo sexual, pois estimula certas regiões cerebrais responsáveis pelas pulsões eróticas e, pasme-se, pode ser usada no tratamento da disfunção eréctil. Fiquei siderado por ver refutada uma ideia que eu juraria que tinha ouvido, pelo menos assim o pensava, e, mais do que isso, tinha crido nela. Não encontrei, na internet, indício que ligasse a cânfora, mesmo misturada com vinho, a uma diminuição do interesse pelo sexo. Será que inventei a história e passei a acreditar nela? Parece-me uma ideia demasiado rebuscada. Uma pessoa a pensar que a cânfora era um potenciador da hipolibidemia, um autêntico anafrodisíaco, e afinal não passa de um concorrente verde, apesar de ser branca, do comprimido azul. Descobri que outrora os monges punham raminhos de vitex agnus-castus nas roupas dos noviços, para que nestes se acalmassem os ardores, mas o vitex agnus-castus não é cânfora, mas liamba, e nunca ouvi dizer que na tropa se misturasse liamba ao vinho para esses fins pacificadores. Também consta que já no século XIX se duvidava da eficácia da medida, refiro-me à liamba na roupa dos noviços. Um narrador ocioso começa a falar no azul do céu e acaba a perorar sobre a concorrência ao Viagra e a fazer considerações sobre coisas que uma pessoa de bem não devia considerar.
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