O telhado branco do pavilhão desportivo da escola aqui ao lado resplandece. Os raios solares, ao incidirem naquelas amplas superfícies, levemente inclinadas, causam uma fulguração intensa, apesar de branca, que os olhos dificilmente suportam. É o destino dos homens não suportarem uma luz excessiva. Se algum deles traz uma luz intensa, os outros não a suportarão e não o suportarão, e haverão de o amaldiçoar, pois nem os seus olhos, nem o seu pensamento, nem o seu coração foram feitos para esse excedente de luz que, apesar de insignificante, traz consigo uma diferenciação. É plausível pensar que a estranha história narrada por Platão e que ficou conhecida por Alegoria da Caverna não seja outra coisa senão uma reflexão sobre o quão insuportável é para a humanidade ter de conviver com alguém que é portador de luz. A Alegoria da Caverna é interpretada recorrentemente de modo filosófico, tanto epistemológico como metafísico, mas na verdade ela é um arquétipo sociológico, um modo de entender as relações sociais entre o comum e o incomum. Mesmo os mais ardentes defensores das diferenças sociais se tornam igualitaristas na hora em que percebem alguém que é mais dotado do que eles. Um acaso, coisa que sucede tantas vezes, levou-me a ver uma série de reproduções de esculturas de Antony Gormley, onde o corpo humano é o tema. Imagino que o escultor tenha pegado em cada um dos prisioneiros da caverna de Platão e o tenha submetido a uma diferenciação específica. Interrogo-me como se sentirão eles nesses corpos que no lugar de os assemelhar os diferenciam, como se pertencessem a espécies estranhas. Provavelmente, tremerão de medo perante o horror do que vêem. O telhado branco do pavilhão continua preso na sua cintilação branca, cai sobre os olhos como um punhal. O melhor será ir buscar os óculos escuros.
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