Acabei de receber uma mensagem de que a minha encomenda já
está disponível na loja. A encomenda é as traduções das Geórgicas e das Bucólicas,
de Vergílio, editadas, o ano passado, pela Cotovia, a moribunda editora. Não
tinha dado por elas e foi um acaso que me as fez descobrir. Desconheço o
motivo, por certo um conflito teórico ou de tradição universitária, que leva o
tradutor destas duas obras a grafar o nome do autor como Vergílio, enquanto o
tradutor da Eneida o denomina Virgílio. O mundo tem muitos mistérios. Hoje
levantei-me cedo, pois tinha uma tele-reunião às 8:30. Lá videoconferenciei o
melhor que fui capaz. É nestas alturas que penso coisas terríveis. Quando
cheguei às funções que me ajudam a pagar as contas e a suprir a maldita
necessidade, ninguém com a minha idade actual se arrastava por aqueles lugares
inóspitos. Já tinha saído pelo menos há quatro anos e dedicava-se a passear ou
a fazer o que lhe dava na real gana. O melhor é não me deixar tomar por
sentimentos negativos, pensei, pois se para mim é desagradável este degradar-me
perante os olhos atentos de terceiros, bem pior é para aqueles que têm de
suportar as minhas idiossincrasias, o desacerto que tenho da realidade, as minhas
ideias abomináveis sobre o que deveria ser a ordem do mundo. Vou comer qualquer
coisa e tomar café, pois não tarda terei de revideoconferenciar. Um dos
homúnculos que vive na caverna do meu inconsciente tomou o elevador e parou
mesmo à entrada da porta da consciência e atirou-me de chofre: cada um tem o
que merece, ninguém te mandou ser idiota e não me teres dado ouvidos. Não dei.
De facto, o mundo tem muitos mistérios.
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