Um almoço tardio de domingo.
Depois, como em outros tempos, a refeição prolongou-se entre conversas de
ocasião. Não tarda e todos terão de voltar para os sítios por onde conduzem as
suas existências. Em tudo isto há uma espécie de recapitulação, mas com
personagens diferentes e os que se mantêm ocupam outros lugares na pirâmide
etária. Lembro-me muito bem desses domingos em que eu actuava no palco dos mais
novos. Cabe-me, agora, o lugar oposto. Só se percebe o que isso significa quando
se chega aí, quando os carros começam a sair e de lá de dentro há mãos a acenar,
se trocam despedidas e em vez de escutar diz-se boa-viagem e se ouve obrigado,
obrigada, adeus avô. Estes são os calendários mais autênticos e os mais
terríveis. Neles não se rasgam as folhas dos meses até que estes voltem, numa
dança que parece sem fim, como se nada tivesse acontecido. Neste outro apenas
se muda de lugar até que o nosso seja suprimido e a outros caiba dizer
boa-viagem. Será para isto que um dia se terá inventado a palavra tradição,
para que alguém diga boa-viagem e outros acenem de dentro de um carro. Não é a
nostalgia que invade a consciência em domingos destes, mas a certeza de que o
tempo é um cavalo sem freio e que não há nada mais evidente sobre este mundo do
que a nossa finitude, do que a nossa transitoriedade. E estas fazem parte da
velha justiça que regula o cosmos que nos foi dado para viver.
Sem comentários:
Enviar um comentário