segunda-feira, 14 de março de 2022

Múmias

Sou informado de que há oito mil anos já havia múmias no vale do Sado. Talvez, imagino, o território português seja o lugar de origem da mumificação. Esta conclusão não a retiro da notícia, mas de ver por aí tanta múmia viva. A mumificação geral da nossa sociedade alguma causa haverá de ter. Esta – a de ser uma antiquíssima tradição – parece-me a melhor explicação disponível. Antes de sermos mumificados, já somos autênticas múmias. Eu sei que há por aí muita gente que se acha o contrário de múmia, pessoas sempre em movimento, sempre com o cérebro a fervilhar de ideias, sempre prontas para lançar o caos. O lamentável é que na essência são autênticas múmias, e o que conta não é a aparência, mas a essência. Há múmias paralíticas – para citar uma séria humorística brasileira cujo nome não se mumificou na memória – e há múmias andantes, múmias de triste figura, talvez parentes, por linhagem colateral, daquele cavaleiro manchego que confundia moinhos com gigantes. As segundas-feiras não deveriam ser propícias para a exibição dos meus dotes de sociólogo, mas, à falta de assunto, não consegui evitar. Pior, seria ter dotes de economista. Punha-me aqui a fazer previsões e, como qualquer economista que se preza, não as conseguiria acertar, mesmo depois dos factos ocorridos. Em economia nem depois dos jogos é seguro fazer previsões. Amanhã, pelas doze horas, Março atingirá o meio do caminho. O tempo voa, embora não se lhe conheçam asas, nem hélices.

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