Distraído e alienado de tudo o que é essencial, não dei pelo solstício de Inverno. Foi ontem, pelas 21horas e 48 minutos. Estamos na estação mais fria e não me despedi do Outono. Estas coisas são imperdoáveis. Bem faziam os povos antigos que não se esqueciam de assinalar estas efemérides, não fosse o diabo tecê-las. Agora, os dias começam a crescer e as noites a diminuir, pois o ano é regulado por um movimento pendular. Este movimento traz com ele uma mensagem. Por mais que as coisas mudem elas hão-de voltar ao seu lugar. E que lugar é este? Cada um dos pontos que o pêndulo no seu ir e vir vai ocupando. Isso é uma visão muito conservadora, diz um dos homúnculos que habita na caverna da minha consciência, pois não nos podemos banhar duas vezes na mesma água do mesmo rio, acrescentou, alardeando erudição e uma despropositada tendência heraclitiana. Poderia ter-lhe respondido que o fluxo contínuo e a mudança incansável de tudo o que existe não passam de uma ilusão sensorial e de um enviesamento do espírito seduzido pelos dados sensoriais. Evitei, porém, entrar em discussão e mandei-o regressar ao lugar de onde saíra. Não temos um dia luminoso de Inverno, mas uma tristeza sombria a pairar sobre a pequena cidade onde arrasto o peso da existência. O Natal aproxima-se, já que os dias, as horas e até os instantes não sabem fazer outra coisa senão passar, presos a uma ânsia de voltar ao lugar de onde partiram.
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