Isto parece estar mau para os profetas. As profecias meteorológicas anunciavam quase um dilúvio, mas as nuvens têm-se mostrado renitentes em conceder a sua graça a quem se entrega a este tipo de augúrios. Pelo menos, por aqui. Pude ir à rua sem guarda-chuva. Constatei que o mundo mudou. Durante muito tempo vi fecharem as padarias, as velhas padarias que alimentaram a população durante décadas. Ora, hoje fui a uma padaria nova com o nome de uma encarnação da divindade hindu. Gente na casa dos quarenta anos, talvez um casal, que nunca vira por aqui, abriu um negócio, como aqueles que existem nas grandes cidades, trazendo uma nova forma de conceber o pão e de o vender. Depois, desta visita à inovação, fui a uma mais antiga pastelaria comprar um bolo-rainha. Encontrei pessoas conhecidas, algumas que envelheceram de forma desmedida. Há muito que não as via. Tomei café com um casal amigo e, no fim, desejámo-nos, mutuamente, um bom ano de 2023, embora toda a gente, conhecida ou não, o faça, se, por algum motivo, entra em contacto com qualquer outra pessoa. Estes rituais, muito deles meramente linguísticos, são importantes, pois é o ritual que salva a existência da usura do quotidiano. As sociedades modernas são máquinas de destruição de mitos e ritos, mas estes lá vão resistindo, reinventando-se para balizar a vida de cada um. Amanhã será dia de Ano Novo e este terá também os seus rituais e a sua própria mitologia.
Sem comentários:
Enviar um comentário