Imaginemos uma agência de viagens desejosa de atrair clientes para destinos turísticos desafiantes. Imaginemos ainda que esta semana pretende vender como destino um certo país que, por acaso, é uma ilha. Nos folhetos de promoção, pois a agência ainda opera com papel, mas também no site, o leitor encontra a seguinte descrição publicitária: Mas este país é uma ilha, a que a própria natureza impõe leis imutáveis. É a terra da verdade (um nome aliciante) rodeada de um largo e proceloso oceano, verdadeiro domínio da aparência, onde muitos bancos de neblina e muitos gelos a ponto de derreterem, dão a ilusão de novas terras e constantemente ludibriam, com falazes esperanças, o navegante que sonha com descobertas, enredando-o em aventuras, de que nunca consegue desistir nem jamais levar a cabo. É possível que antes de querer saber mais sobre esse país-ilha, se interrogue sobre o publicitário que escreveu o texto. Sem saber a resposta, entrega-se a um longo devaneio sobre como atravessar aquele oceano proceloso, como abrir caminho pela neblina e como evitar o gelo traiçoeiro, para não se deixar enganar por falsas terras e poder chegar são e salvo a esse país verdadeiro, onde poderá admirar a constância das leis e passar umas sossegadas férias sem temer o bulício da mudança e os alvissareiros da novidade. A sua imaginação fica presa naquelas esperanças falazes e nas aventuras que há-de querer viver, e que o publicitário, para estimular o desejo da viagem e os lucros da agência, lhe diz que nunca será capaz de levar a cabo. Pois aquilo que os homens mais amam, eis uma generalização miserável, são as coisas impossíveis, pois das possíveis depressa se cansam. Ora, é na página 257 da Crítica da Razão Pura, que Kant, o publicitário, anuncia esse país do entendimento puro, que ele terá percorrido. Aquilo que ele lá fez, omito-o aqui, mas estou certo de que qualquer viageiro inclinado para a aventura, ao ler a publicidade desse país, fica a sonhar com oceanos procelosos e aventuras de que nunca desistirá e que, pela força da sua vontade e indústria da sua inteligência, como Ulisses, há-de levar a cabo para se encontrar, nessa ilha, com a amada Penélope e matar, com o vigor do seu braço, os incautos pretendentes.
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