segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Um belo tempo

Novembro está por um fio. Nem ao fim-de-semana chegará, morre na quinta-feira e enterra-se na sexta, dia em que se comemora a defenestração do Miguel de Vasconcelos. Consta que aquilo não foi bonito de se ver. Quando foi encontrado no palácio real, os conjurados crivaram-no de balas. São coisas que acontecem. Morto, atiraram-no pela janela. O que o povo fez ao corpo foi uma verdadeira profanação. Talvez inspirados na Antígona de Sófocles, os vitoriosos deixaram-no na rua para ser lambido pelo cães. Talvez todos os dias gloriosos tenham escondida uma luz tenebrosa, pois a glória, quando trata das coisas terrenas, não é mais que o exercício das paixões mais ardentes, as políticas, assunto não permitido neste blogue. O dia de hoje não foi muito diferente do de ontem. Névoas e nevoeiros, mas nada de D. Sebastião. Atravessei a cidade duas vezes e havia nela uma grandeza que não se encontra nos dias luminosos. É como se o tempo nebuloso lhe fizesse aparecer os traços de lugar muito antigo, onde as próprias rugas são um sinal não apenas de dignidade, mas ainda de uma beleza que o sol não ilumina. Talvez sejam os meus supostos genes das terras frias do Norte a falarem. Quando a cidade está assim, sinto-me em casa e há em mim um contentamento que não sei bem de onde virá. Recosto-me na cadeira, olho a rua e o mundo parece perfeito ou o melhor dos mundos possíveis.

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