Cheguei tarde a casa e, para dizer a verdade, a vontade é de sair de novo para ir jantar a qualquer lado. Não o faço, para não desmerecer da nutricionista, uma rapariga cheia de boa vontade e mesmo de boas intenções, que decidi consultar há um mês, e me prescreveu uma dieta que vou cumprindo na medida dos meu apetites e dos meus humores. A ideia aqui é sublinhar menos apetites e humores e mais o vou cumprindo. Lido com o assunto como se a dieta tivesse um significado dupla. Por vezes, prescritivo; outras, facultativo. Como hoje me consultei com ela e dos nove quilos a perder, que pactuámos que eu perderia num prazo relativamente alargado, perdi um quarto, para não desmerecer do seu entusiasmo encenado hoje fico por um jantar em casa, tudo muito saudável. Amanhã, por certo, já terei esquecido a consulta de hoje e poderei transformar as indicações prescritivas em conselhos facultativos e tomar a decisão de que umas quantas coisas tocadas pelo vento das calorias serão, pelo menos, permitidas, para não dizer obrigatórias. Pior do que tudo isso é aquela passagem de “The Dry Salvages”, dos Quatro Quartetos, de Eliot, que reza assim: Para a maioria de nós há apenas o negligenciado / Momento, o momento dentro e fora do tempo, / O assomo de descuido, perdidos num feixe de luz de Sol. Não somos santos, queria o poeta dizer. Eu confirmo e embora não me entregue sem limites ao pecado da gula, a verdade é que o transformei de capital em venial, na taxionomia que a Igreja declinou, e não tenho inclinação para desprezar a boa mesa. Não sei o que me deu para ir consultar uma nutricionista.
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