Eis a natureza das coisas. Quais coisas, perguntar-se-á perante a proclamação. Aquelas que Wisłava Szymborska observava com os olhos com que escrevia. Por exemplo, ela via a realidade do futuro, do silêncio e do nada. Quando pronuncio a palavra Futuro, / a primeira sílaba já pertence ao passado. //Quando prenuncio a palavra Silêncio, destruo-o. // Quando pronuncio a palavra Nada, / crio algo que não cabe em nenhum não-ser. Imagino que ela tem um olhar dialéctico, pois em cada coisa observa a sua negação. Descubro uma fotografia dela, talvez pouco tempo antes de morrer aos 88 anos. Tornara-se com o passar dos anos uma mulher bela, mais do que era nas fotografias em que surge bem mais jovem, como se a beleza humana se tivesse deserotizado e ficasse reduzida à sua essência. Também neste facto há qualquer coisa de negação dialéctica, de superação, para falar à maneira de Hegel. A natureza do futuro é transformar-se em passado, a do silêncio é a de tornar-se som, palavra, a do nada é a de devir alguma coisa. Esta é a natureza das coisas, mas o facto de ser a sua natureza não elimina o mistério que há em cada uma. Aliás, qualquer natureza é já por si mesma um mistério. Os olhos de Wisłava viam aquilo que nós não vemos, não porque ela sofresse de alucinações, mas porque os olhos dos poetas têm uma acuidade que os outros não têm, estão preparados para tocar no fogo ardente do mistério que cintila na realidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário