Hoje é
feriado. Talvez se devesse dizer dia santo de guarda, mas não sei se esta
expressão, ouvida há muito, faz sentido. A designação do feriado também é
equívoca. Dia do Corpo de Deus. Ora, a definição de Deus implica que, pela sua
imaterialidade, Ele não tenha corpo. A designação correcta deveria ser Dia do
Corpo de Cristo. Contudo, apesar da natureza religiosa do feriado, não estou
capaz de entrar numa meditação teológica, para a qual, além do apetite, me falta
a competência. Os dias de calor já chegaram aqui. A temperatura ultrapassou, de
modo generoso, os trinta graus. Isto é prova de que nem sempre a generosidade é
uma coisa boa. O que se anuncia, porém, é pior. Esta subida de temperatura tem,
apesar de tudo, uma vantagem, a de me oferecer motivo para estes textos,
segundo a velha máxima: quando não se tem nada para dizer, fala-se do tempo. A
máxima pretendia sublinhar a falta de assunto, mas, sem estar no seu horizonte,
ela faz-nos uma revelação acerca da essência do tempo, entendido como clima e
não como duração. Ele é um mediador comunicacional. Imaginemos que um homem e
uma mulher se encontram. A falta de assunto, devido a uma timidez congénita e
dupla, pode matar o futuro daquele encontro. Então falam de nuvens, do frio ou
do calor, se chove ou faz sol. A partir daí aferem gostos e, sem darem por
isso, passa a haver um futuro, pelo menos possível, para aquele par que se
encontrou e estava preso numa incomunicabilidade estrutural. Além de mediador da
comunicação, o tempo é um aferidor de gostos. Portanto, nunca devemos pensar
que falar do tempo é coisa inócua. Não é. Agora, vou ver se está a chover.
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