Os dias úteis começaram carrancudos. Céu cinzento, tempo abafado. Alguém diz estamos no tempo das trovoadas de Maio, oiço responder pois estamos, pois estamos. E a conversa continuou, saltando de assunto para assunto, um modo de ocupar o tempo e de o deixar deslizar. Por certo que, por aqui, Maio tem as suas trovoadas, mas na minha memória são as de Junho que surgem mais rapidamente. Súbitas enxurradas, trovões e relâmpagos. A rua, onde vivi parte da infância, toda adolescência e mais alguns anos, enchia-se de água, que corria para outra rua mais abaixo, talvez com esperança de chegar ao rio. E chegava. Depois, vinha o sol e a Primavera começava a despedir-se do calendário. Hoje podia trovejar e chover, pois a atmosfera está acintosa, era bom que a natureza descarregasse a sua fúria, para depois, mais calma, deixar os mortais entregues aos seus afazeres. Não é bom que a natureza acumula fúrias, raivas, ressentimentos. Não lhe faz bem e quem paga são os homens. Não é que estes não mereçam castigo, mas deixemos isso a quem de direito. Não queremos uma natureza justiceira, mas benevolente e dotada de uma infinita paciência para nos aturar. Bem precisa. Hoje não me ocorre nenhuma ideia. O melhor é parar por aqui, antes que venha o crepúsculo e as sombras se adensem até cobrirem a terra com a folhagem extravagante da noite.
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