Sem se dar por isso, Abril de 2024 escapuliu-se para um lugar de onde não há retorno possível. Se tem de prestar contas – e que mês não terá as suas a prestar? –, não será aqui, mas naquele lugar para onde vão os meses que acabam. Talvez lá, mas isto é uma especulação sem dados empíricos, exista um tribunal, onde, após um processo rigoroso, o mês é julgado por aquilo que deixou acontecer no seu reinado e aquilo que deveria ter acontecido, mas não aconteceu. Será, parece-me, um tribunal de júri, mas também isto é incerto. Como qualquer outro mês, também Abril terá uma equipa de advogados que o defenderão. São especialistas no direito dos meses, gente treinada na barra dos tribunais e que a cada mês tem um cliente novo para defender. Os honorários serão altos – também as acusações são graves – e não se sabe como cada mês encontra dinheiro para saciar a voracidade dos seus defensores. Nesse reino para onde vão os meses acabados ou mortos, houve em tempos uma célebre disputa constitucional. Girou em torno de uma das penas propostas para o caso de um mês ser condenado, o que não é caso raro. Alguém defendeu, mas é incerto quem foi, que em determinadas ocasiões um mês, especialmente culposo, seria condenado a retornar ao calendário e ter uma segunda vida. Argumentou-se que isso possibilitaria a sua redenção, ao tornar-se mais propício a uma existência sensata dos homens. Os defensores da proposta viam na pena um instrumento de recuperação do condenado. Formou-se, de imediato, um partido oposto. Este argumentou que a pena de retorno ao calendário de um mês condenado feria dois direitos fundamentais. Em primeiro lugar, punha em causa o direito de um mês que, assim, não vinha à existência, pois o calendário teria sido ocupado por outro que já fizera o seu papel e agora regressava. Em segundo lugar, o retorno de um mês condenado seria a antecâmara de uma segunda condenação, quando acabasse e voltasse ao reino dos meses mortos para ser de novo julgado, o que contradizia uma norma constitucional que afirma que cada mês só pode ser julgado uma vez. O tribunal constitucional acolheu esta última interpretação e, a partir dessa decisão, já muito antiga, sabemos que nenhum mês que acaba torna a voltar às suas funções no calendário humano. Portanto, não voltaremos a ter um Abril de 2024.
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