terça-feira, 19 de novembro de 2024

Individualidade

A certa altura, no diálogo que mantém com Adimanto, na República, de Platão, Sócrates diz: É então lógico, segundo me parece, que a melhor natureza, alimentada de modo diferente do que lhe convém, se torne pior do que uma natureza medíocre. Adimanto, claro, concorda. Sócrates está a falar de quê? Por natureza está a referir o ser humano e por alimento, a educação. Isto significa que cada um dos seres humanos tem grandes hipóteses de ser medíocre ou ainda pior do que isso. Se nasce com uma natureza medíocre, a educação não fará que ele deixe de ser o que é. Se nasce com uma boa natureza, ainda assim nada está assegurado. Pelo contrário, corre até mais riscos do aquele que é medíocre, caso não encontre uma educação à altura da sua natureza. Em ambos os casos, a pessoa não é responsável por aquilo que é. Ninguém determina a sua própria natureza, nem, em última análise, é responsável pela educação que recebeu. Se alguém é excelente isso deve-se a uma feliz coincidência de se receber ao mesmo tempo uma natureza boa e uma adequada educação. O mérito do indivíduo não entra nesta equação, da qual também está ausente a própria individualidade. Agora, que tanto se vilipendia os tempos modernos, talvez fosse boa ideia perceber que a individualidade, que assinala o nascimento desses tempos, foi uma grande descoberta.

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