Uma coisa boa trazida pela idade é o desinteresse pelos balanços do ano que finda e pelas profecias sobre o que está a chegar. Há umas décadas, dava algum tempo para ler, nos jornais que então comprava, e eram alguns, essas prosas feitas sobre o que o ano fez ao mundo e aquilo que o que vier há-de fazer. Olhava para trás e olhava para diante. Imagino agora que essa literatura não seria particularmente interessante. A única prova – e é uma prova enviesada – é que fui deixando de a ler. Há uma outra alternativa para explicar essa desistência: o medo. Sim, o medo de ter um destino como a mulher de Lot, por um lado, e como o de Actéon, por outro. A Lot foi dito para abandonarem Sodoma, mas que não olhassem para trás. A mulher não resistiu e foi transformada em estátua de sal. Pior destino teve o pobre Actéon. Olhou para a frente e viu Diana despida. A deusa não gostou e transformou-o num cervo. Ora, os seus cães, ao avistá-lo e vendo nele o cervo que agora era, não hesitaram e estraçalharam-no. Se posso dar um conselho, neste último dia do ano, é o de não se preocuparem com o ano que passou, para não se tornarem em estátuas de sal, nem tentem olhar para o que aí vem, não seja o caso de estar alguma deusa nua que condene o voyeur à condição de presa da sua própria matilha. Há que ter cuidado com o destino. De resto, um bom ano.
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